terça-feira, 2 de setembro de 2025

“Entre o fígado e a alma”. A enorme falta que Mino Carta fará

Mino Carta: não existe jornalista neutro (Crédito: Divulgação)

Artigo compartilhado so site MANGUE JORNALISMO, de 2 de setembro de 2025

“Entre o fígado e a alma”. A enorme falta que Mino Carta fará
Por Romero Venâncio*, especial para a Mangue Jornalismo

A seção PONTO DE VISTA é um espaço que a Mangue Jornalismo abre para que pessoas possam expressar perspectivas que estimulem o interesse e o debate público. O artigo deve dialogar com os princípios da Mangue, entretanto ele não precisa representar necessariamente o ponto de vista da organização.

Um raro jornalista que viveu no Brasil. Mas foi além: pintor, romancista, polemista dos bons.

No jornalismo, marcou gerações e influenciou na forma e no conteúdo do exercício de trabalhar com comunicação. Não se trata de elogio vazio. Mino Carta pagou caro por esta maneira de praticar jornalismo. Foi perseguido, odiado, processado e caluniado.

Tinha uma histórica posição antifascista e tomou esta condição como princípio em seu jornalismo, mesmo quando trabalhou em jornais e revistas dos “barões das comunicações”.

Atravessou toda uma ditadura e viveu/sobreviveu de um ofício complicado que é o jornalismo e como bem disse numa entrevista: “militou desde sempre na imprensa”.

Era um homem afinado com as esquerdas, mas nunca escondeu seus elogios a figuras da direita que eram inteligentes. Poucos, mas existem e desempenharam papel importante no jogo da direita.

Mino Carta envelheceu como todo mundo. Na sua profissão, tinha dificuldades até com a televisão. Sua revista entrou na era digital, ele muito pouco. Honestamente dizia que não tinha “competência” para acompanhar. Defendia que jornalista tinha posição, nunca era neutro e quando afirmava que era neutro, era porque já tinha posição (geralmente em favor da “casa grande”).

Duas coisas que aprendi com Mino Carta: escrita não é só conteúdo, mas “forma”, estilo. E o papel da escravidão na formação presente deste Brasil.

Sobre a primeira, digo que Mino Carta foi uma espécie de professor: não dizia apenas que a escrita é conteúdo e forma, praticava. Seus textos chegavam a chatear muita gente pela maneira como citava para tornar mais elegante e para persuadir com suas ideias. Às vezes buscava na língua portuguesa termos inusuais para afirmar coisas graves. Era para ironia, pois sabia que não precisava desse recurso num tipo tão prosaico de jornalismo. Mas o fazia pela elegância e pela ironia.

No seu texto, a beleza da escrita se alinhava dialeticamente com a ironia da velhacaria dos “grandes” deste país. Como trabalhou tanto com os patrões do jornalismo brasileiro, percebeu o comportamento deles. Mapeou os trejeitos deles. Percebeu o ódio aos mais pobres que as classes dominantes sempre alimentaram e espelham como um fungo no tecido social. Abrigou grandes contradições pessoais com este estilo e seu conteúdo. Ninguém lida impunemente com as classes dominantes sem ser marcado por elas. Recomendo uma rara entrevista no programa Roda Viva da TV Cultura em 2000.

A segunda coisa que Mino Carta foi imenso aprendizado foi a sua leitura da escravidão na formação social do Brasil. Não trazia nenhuma novidade. Podemos ler tudo que ele dizia em Clóvis Moura ou Florestan Fernandes. Mas dentro do jornalismo (às vezes tão apequenado e pobre em historiografia), isto era digno de nota.

Para Mino Carta, as classes dominantes brasileiras são racista por herança escravista e por ódio a toda sorte de pobres. No Brasil não basta dominar, tem que humilhar. O curioso é que o que ele aprendeu sobre a escravidão no Brasil não foi com Florestan Fernandes (acredito que tenha lido, por certo!). Aprendeu muito com Machado de Assis. Foi leitor/seguidor do nosso Machado maior. Nos seus escritos e leituras sobre e com Machado de Assis, deixou uma série de pistas que poderia ser estudado pelas gerações futuras.

Uma coisa é certa: Mino Carta fará uma enorme falta.

Mino nasceu em Gênova, na Itália, em 1933, e morreu hoje (02/09) em São Paulo.

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* Romero Venâncio é graduado em Teologia pelo Instituto de Teologia do Recife (ITER), em Filosofia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), mestre em Sociologia pela mesma universidade e doutorado Interinstitucional em Filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É professor de Filosofia na Universidade Federal de Sergipe (UFS) e presidente da Adufs (Sindicato das(os) Docentes da Universidade Federal de Sergipe).

Texto e imagem reproduzidos do site: manguejornalismo org

MINO CARTA (1933 - 2025)

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Morre o jornalista Mino Carta

Post compartilhado do Facebook/Rádio Bandeirantes, de 2 de setembro de 2025 

Morreu o jornalista Mino Carta, fundador e diretor de redação da CartaCapital, aos 91 anos, nesta terça-feira (2). Ao divulgar o óbito, a própria revista informou que a última passagem dele foi no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, internado há duas semanas, em decorrência de problemas de saúde não revelados.

Nascido em Gênova, Mino faz parte da terceira geração de jornalistas da família, tradição iniciada pelo avô materno Luigi Becherucci, diretor do jornal genovês Caffaro, até perder o cargo em meio à perseguição fascista. 

O pai de Mino foi preso em abril de 1944, devido à ferrenha oposição ao regime de Benito Mussolini, mas conseguiu fugir dois meses depois.

Logo após o término da Segunda Guerra, aceitou um convite para trabalhar no Brasil. Por intermédio do amigo Francisco Malgeri, conheceu o industrial italiano Francisco Matarazzo Júnior, que acabara de adquirir a maior parte das ações da Folha de S. Paulo e o contratou para dirigir o jornal.

Aos 27 anos, Mino aceitou o convite para dirigir uma nova revista, a Quatro Rodas. Lançou as revistas Veja, em 1968, IstoÉ, em 1976, e CartaCapital, em 1994. Esteve à frente da equipe fundadora do Jornal da Tarde, em 1966, reconhecido pela modernidade na paginação e pela qualidade literária das reportagens que inspiraram gerações de jornalistas. 

Mino também é doutor honoris causa pela Faculdade Cásper Líbero, uma das principais escolas de jornalismo do Brasil. Em novembro de 2006, recebeu o prêmio de Jornalista Brasileiro de Maior Destaque no Ano, da Associação dos Correspondentes da Imprensa Estrangeira no Brasil-AClE.

Texto e imagem compartilhados do facebook/Rádio Bandeirantes

Morre Mino Carta, jornalista e fundador da Carta Capital

Publicação compartilhada do site G1 GLOBO SP, 2 de setembro de 2025 

Mino Carta, jornalista e fundador da Carta Capital, morre aos 91 anos em SP

Diretor de redação da revista faleceu nesta terça (2) no Hospital Sírio-Libanês, na capital paulista. Segundo a revista, ele 'lutava contra problemas de saúde'.

Por Redação g1 SP — São Paulo

O fundador e diretor de redação da revista Carta Capital, o jornalista Mino Carta, morreu nesta terça-feira (2) em São Paulo. Segundo a publicação, ele tinha 91 anos e "lutava contra os problemas de saúde, em idas-e-vindas do hospital".

Mino Carta faleceu no Hospital Sírio-Libanês, onde nas duas últimas semanas esteve internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Segundo amigos do jornalista disseram à GloboNews, o velório começará às 12h desta terça no Cemitério São Paulo, em Pinheiros, Zona Oeste da capital.

A morte de Mino Carta foi confirmada às 5h59 pela revista que ele criou. A Carta Capital informou no seu site oficial e em suas redes sociais que a trajetória de seu fundador se confunde com a história do jornalismo brasileiro.

Nascido em Gênova, na Itália, o jornalista criou e dirigiu algumas das revistas mais influentes do país, como Quatro Rodas, lançada em 1960, Veja (1968), Isto É (1976) e Carta Capital (1994).

Também esteve à frente do Jornal da Tarde, criado em 1966, considerado revolucionário pela linguagem e diagramação.

A publicação lembra que até mesmo o maior fracasso de Mino, o Jornal da República, de 1979, em meio à abertura política, é visto como marco da imprensa nacional. Ao longo da carreira, enfrentou embates com a ditadura militar, especialmente quando a Veja publicou denúncias de tortura, o que resultou em censura e pressões.

Em entrevistas recentes, Mino demonstrava desencanto com a política brasileira e criticava os impactos da tecnologia sobre o jornalismo, afirmando que a imprensa estava “escravizada pelas novas mídias”.

De acordo com a Carta Capital, o jornalista dizia que sua maior realização foi a própria revista que fundou em 1994, construída sobre três pilares: fidelidade aos fatos, espírito crítico e fiscalização do poder. A publicação completou 31 anos em 2025.

Além da carreira editorial, Mino se dedicou à literatura, com romances como Castelo de Âmbar (2000), A Sombra do Silêncio (2003) e A Vida de Mat (2016), que misturam memórias pessoais e reflexões filosóficas.

Amizade com o presidente Lula

Ao criar a revista Isto É, o jornalista estreitou as relações com o então metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ao publicar a primeira grande entrevista com o líder sindical em 1978. Na época, Lula presidia o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista.

Desde então, Mino Carta e Lula nutriram uma relação de profunda amizade. O último encontro público deles aconteceu em São Paulo, em junho do ano passado, e foi registrado pela assessoria de imprensa da Presidência da República (veja foto abaixo).

Por meio de nota, Lula se disse muito triste com a morte do amigo e relembrou a relação de mais de 50 anos entre os dois. O presidente brasileiro afirmou que "Mino foi – e sempre será – uma referência para o jornalismo brasileiro por sua coragem, espírito crítico e compromisso com um país justo e igualitário para todos os brasileiros e brasileiras".

"Recebi com muita tristeza a notícia da morte de meu amigo Mino Carta, ocorrida na madrugada deste 2 de setembro. Ele fez história no jornalismo brasileiro: criou e dirigiu algumas de nossas principais revistas (Veja, Isto é, Quatro Rodas, Carta Capital, Jornal da Tarde, Jornal da República) e formou gerações de profissionais e, sobretudo, mostrou que a imprensa livre e a democracia andam de mãos dadas. Em meio ao autoritarismo do regime militar, as publicações que dirigia denunciavam o abuso dos poderosos e traziam a voz daqueles que clamavam pela liberdade", escreveu o presidente.

"Conheci Mino há quase cinquenta anos, quando ele, pela primeira vez, deu destaque nas revistas semanais para as lutas que nós, trabalhadores reunidos no movimento sindical, estávamos fazendo por melhores condições de vida, por justiça social e democracia. Foi ele quem abriu espaço para minha primeira capa de revista, na Istoé, em 1978. Desde então, nossas trajetórias seguiram se cruzando. Eu, como liderança política, ele, como um jornalista que, sem abdicar de sua independência, soube registrar as mudanças do Brasil. Vivemos juntos a redemocratização, as Diretas Já, as eleições presidenciais e as grandes transformações sociais das últimas décadas", declarou o petista.

E emendou: "Estas décadas de convivência me dão a certeza de que Mino foi – e sempre será – uma referência para o jornalismo brasileiro por sua coragem, espírito crítico e compromisso com um país justo e igualitário para todos os brasileiros e brasileiras. Se hoje vivemos em uma democracia sólida, se hoje nossas instituições conseguem vencer as ameaças autoritárias, muito disso se deve ao trabalho deste verdadeiro humanista, das publicações que dirigiu e dos profissionais que ele formou. À sua filha Manuela e a todos os seus familiares e os inúmeros amigos que construiu ao longo de sua vida, deixo um forte e carinhoso abraço".

O Palácio do Planalto anunciou que Lula deve vir a São Paulo nesta terça-feira (2) para o velório e as despedidas finais à Mino Carta.

Outras repercussões

O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) também publicou uma mensagem nas redes sociais lamentando o falecimento do jornalista.

"O Brasil perdeu hoje um de seus maiores jornalistas. Mino Carta dedicou toda sua vida à criação e ao desenvolvimento de publicações que fizeram história na imprensa brasileira, dando voz à defesa dos valores democráticos. Que seu exemplo siga inspirando as novas gerações de jornalistas", disse Alckmin na rede social X.

Texto e imagens reproduzidos do site: g1 globo com sp

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Morre um dos ícones de uma geração do humor: Jaguar

Longevo, ele estava com 93 anos (Divulgação)

Publicação compartilhada do site do JORNAL DO BRASIL, de 24 de agosto de 2025 

Morre um dos ícones de uma geração do humor: Jaguar

O artista estava internado no Hospital Copa D’Or, onde tratava de pneumonia

Por CADERNO B com Revista Fórum

redacao@jb.com.br

Por Marcelo Hailer - O cartunista Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, conhecido como Jaguar, morreu neste domingo (24) aos 93 anos. Ele estava internado no Hospital Copa D’Or, onde recebia tratamento para pneumonia. A informação foi confirmada por familiares.

Trajetória

Jaguar, pseudônimo de Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe (Rio de Janeiro, 29 de fevereiro de 1932 – 24 de agosto de 2025), foi um dos cartunistas mais influentes do Brasil. Tornou-se conhecido nacionalmente como um dos fundadores do jornal satírico alternativo O Pasquim, em 1969, publicação que marcou a imprensa brasileira durante a ditadura militar.

Sérgio Jaguaribe iniciou sua carreira em 1952 na revista Manchete, quando, por influência do cartunista Borjalo, passou a assinar apenas como Jaguar. Na mesma época, trabalhava no Banco do Brasil sob a supervisão de Sérgio Porto, que o incentivou a manter o emprego enquanto desenvolvia sua carreira no humorismo.

Na década de 1960, consolidou-se como um dos principais cartunistas da revista Senhor, colaborando também com a Revista Civilização Brasileira, a Revista da Semana, o semanário Pif-Paf e os jornais Última Hora e Tribuna da Imprensa. Em 1968, lançou sua primeira coleção de charges, Átila, você é bárbaro. No ano seguinte, fundou O Pasquim ao lado de Tarso de Castro e Sérgio Cabral, sendo o único a permanecer na publicação até o encerramento, em 1991, quando passou a editar o jornal A Notícia.

Ao longo de sua carreira, Jaguar realizou trabalhos marcantes que atravessaram gerações. Em 2013, produziu uma charge reunindo personagens da Turma da Mônica e da Sig para celebrar, respectivamente, os cinquenta e os quarenta e nove anos das duas criações. Além disso, manteve-se como um crítico atento da política e da sociedade brasileira, com sua obra reconhecida por ironia, acidez e relevância cultural.

Durante o período da ditadura militar, Jaguar foi preso por três meses em 1970, sendo libertado no réveillon daquele ano. Em 5 de abril de 2008, ele e outros vinte jornalistas perseguidos durante o regime tiveram seus processos de anistia aprovados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, reconhecendo formalmente as perseguições sofridas.

Em 2016, após 30 anos de atuação, foi demitido do jornal O Dia, encerrando um ciclo duradouro na imprensa carioca. Até seus últimos anos, Jaguar continuou ativo na produção de charges e no comentário crítico da sociedade, deixando um legado indelével para a história do jornalismo e da caricatura no Brasil. 

Texto e imagem reprroduzidos do site: www jb com br/cadernob

domingo, 24 de agosto de 2025

Imprensa Oficial de Sergipe celebra 130 anos








Fotos: Erick O'Hara

Artigo compartilhado do site GOVERNO DE SERGIPE, de 24 de Agosto de 2025 

Imprensa Oficial de Sergipe celebra 130 anos de registro dos atos do Governo do Estado

Por meio do Diário Oficial, órgão documenta resoluções e ações da esfera pública estadual

Neste domingo, 24, a Imprensa Oficial de Sergipe (Iose) completa 130 anos. Já no próximo 1º de setembro, o estado celebra o marco efetivo da circulação do primeiro Diário Oficial (DO) de Sergipe, ocorrido em 1895. Ao longo desses anos, o órgão e a publicação têm ajudado a documentar os atos oficiais do Governo do Estado, assim como fatos e interesses do povo sergipano.

O governador Fábio Mitidieri explica que o veículo de comunicação oficial do governo contribui para a transparência e a legalidade da administração. "A Imprensa Oficial, por meio do Diário Oficial, leva os atos do governo à toda a população, mas não só isso. Ela também representa a história de Sergipe, registrada em Leis, Atos, Decretos e publicações, por mais de um século. Por meio dela, nossa história e tradição estão documentadas e isso precisa ser valorizado”, destaca.

Para o diretor-presidente da Iose, Francisco Gualberto, a empresa cumpre o importante papel de guardar e disponibilizar a história do Estado para a população. “Quando não temos nossa história preservada, fica difícil comparar o presente e projetar o futuro porque se perde o parâmetro. Portanto, esse aspecto, por si só, reveste-se de grande importância”, ressalta. Outro aspecto destacado por ele é que a Imprensa Oficial é a casa da fé pública, pois, quando o governador do Estado sanciona uma lei, ela é finalizada com a publicação no Diário Oficial. “Ou seja, essa lei passa a ter valor ou fé pública a partir da publicação no Diário Oficial. Isso vale para as ações de governo, decretos, leis e outras decisões, mas, também, para muitas questões da iniciativa privada”, reforça.

Em seus 130 anos, a Imprensa Oficial de Sergipe passou por modernizações, com foco em tornar cada vez mais seguro e acessível seu conteúdo. “Recentemente, modernizamos todos os equipamentos relacionados à publicação do Diário Oficial. Hoje, temos equipamentos modernos, com tecnologia avançada, para que o diário seja o mais perfeito possível”, diz Francisco Gualberto. O diretor acrescenta que a Iose tem, também, um contrato com uma empresa que fornece o software mais moderno da área, incluindo um software reserva, “o que garante a qualidade e nos dá segurança quanto à publicação”, assegura.

Desde 2023, o DO passou a disponibilizar, também, alguns dos principais conteúdos jornalísticos diários produzidos pela Comunicação do Estado, contextualizando as ações do Estado em prol dos sergipanos, como destaca o secretário de Estado da Comunicação Social, Cleon Nascimento. “Buscamos deixar o Diário Oficial mais dinâmico e informativo, inserindo, nas duas primeiras páginas, as principais notícias do dia, para aproximar ainda mais a população da atuação do governo. Além de ser um veículo essencial para a transparência da gestão pública no presente, o DO se consolidou como um documento de grande valor histórico, preservando a memória e os registros oficiais do Estado”, destaca. 

Assinatura eletrônica e editora

Além da publicação do Diário Oficial do Estado, a Iose é responsável pela Editora Diário Oficial de Sergipe (Edise) e oferta o serviço de Registro de Certificação Digital. “A maioria dos ambientes públicos e privados, atualmente, não trabalha mais apenas com assinatura de base física e, sim, com assinatura eletrônica. Temos um software de qualidade para  assinatura eletrônica, inclusive para a iniciativa privada, com menor preço”, garante Gualberto, ao informar que o serviço é muito solicitado por advogados, médicos, gestores e outros profissionais tanto da iniciativa pública quanto da privada. 

Já a Edise, inaugurada em 2009, tem a missão de levar o leitor a aproximar-se da cultura sergipana, por meio de obras escritas, principalmente, por autores locais, as quais exibem os costumes e as crenças dos sergipanos, além de publicar livros de personalidades que contribuíram para a história de Sergipe e do país. A Editora Diário Oficial de Sergipe também é responsável pela revista Caçuá, desde 2023, e, anteriormente, pela circulação da Cumbuca, publicações voltadas a aspectos culturais do estado, com textos e imagens que englobam música, dança, literatura, teatro, folclore e várias outras vertentes da cena cultural sergipana.  

História

A história da Imprensa Oficial de Sergipe tem início a partir da Lei 106, de 5 de dezembro de 1894, quando o presidente do Estado, Manoel Prisciliano de Oliveira Valladão, vê a necessidade, no início da República, de publicizar oficialmente os atos da presidência. A lei deu a garantia de aquisição da tipografia, que daria início a impressão do Diário Oficial e foi sancionada em 24 de agosto de 1895. Já em 1º de setembro daquele ano aconteceu a circulação do primeiro Diário Oficial de Sergipe, criando, oficialmente, a Imprensa Oficial sergipana. 

Segundo a historiadora Edna Matos, a criação da Imprensa Oficial de Sergipe acontece em um momento em que, tanto nacional quanto localmente, o sistema republicano, após a crise da Monarquia, tentava se institucionalizar e se adequar para que o Brasil entrasse numa era de desenvolvimento capitalista. Esse movimento repercute, também, em Sergipe, uma vez que, nas décadas anteriores, já havia no estado grupos e jornais que discutiam as ideias republicanas e clamavam por reformas. “Em Sergipe, considerava-se que muitas coisas estavam atrasadas e precisavam de modernização. Entre essas dimensões, estava, ainda, a imprensa. A criação do Diário Oficial expressa o desejo de também modernizar a forma como o poder se comunicava com a sociedade”, explana.

A pesquisadora pontua que o órgão de imprensa oficial divulgava ações, acontecimentos e opiniões, que ajudaram a consolidar o regime republicano em terras sergipanas. “Era uma forma de imprensa mais organizada, mais profissionalizada, com características capitalistas, que, por ser a porta das mensagens, dos interesses e da modelagem política do Estado republicano, tinha exatamente essa missão e perfil. E foi fundamental, trazia informações sobre agricultura, economia, impostos e, também, muitas notícias de outras partes do país, ou seja, não era um órgão apenas da divulgação do que estava acontecendo internamente no Estado e foi extremamente importante por ser um veículo de informações, notícias e conhecimentos muito amplo”, contextualiza.

Texto e imagens reproduzidos do site: www se gov br/noticias

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

'A agonia da grande reportagem', por Luciano Correia

Joel Silveira conversando com Luciano Correia

Artigo compartilhado do site SÓ SERGIPE, de 31 de julho de 2025 

Mídia, Cultura e Ebulições

A agonia da grande reportagem
Por Luciano Correia (*)

No mundo inteiro o jornalismo vive uma fase de precarização, dos salários ao faturamento das empresas, perdendo relevância com a substituição do lugar da notícia pelas narrativas, produzidas e turbinadas por gente de fora do circuito, os tais influencers. O problema aqui não é o espírito corporativista contra invasões de terceiros. Influencer, essa categoria amorfa e imprecisa, não tem compromisso com os protocolos do jornalismo, o rigor técnico na apuração dos fatos e uma moral regida pela ética. E se ética parecer um conceito abstrato, vai uma definição de corpus bem conceituado: o código de ética do jornalismo.

Influencer, de maneira geral, nem sabe o que é isso, e está menos ainda preocupado com essa conversa sobre ética, que lhe parece cosmética, perfumaria pura para dourar o discurso do jornalismo chamado de profissional. Jornalista não: pode ser raso na forma e no conteúdo, fraco no texto e medíocre na visão do mundo, mas passou pelo domínio de uma ferramenta tão fabulosa quanto o soro caseiro. Me refiro à linguagem jornalística, esse conjunto de regras simples, portanto não muito complexo, que através de um conceito chamado de lead dá conta da narração de um fato com a integridade mínima para informar num parágrafo de cinco linhas.

Isso nem todos dominam. Os advogados, por exemplo, alguns cultos, intelectuais refinados e muitas vezes oradores brilhantes, nem sempre conseguem dar conta de uma simples notícia factual. O jornalismo mais antigo, de antes do diploma, acusava dezenas e centenas de advogados em redações no país inteiro. Muitos, de fato, dominaram a linguagem objetiva do jornalismo, outros se perdiam numa peroração retórica de textos palavrosos. Ou, como dizia Caetano: demasiadas palavras, fraco impulso de vida.

Essas reflexões me vieram à mente a propósito da exibição, essa semana, na disciplina de Jornalismo Especializado, do documentário Garrafas ao Mar: a Víbora Manda Lembranças, do grande jornalista Geneton Moraes Neto.  O filme é uma robusta aula de Jornalismo, baseada na trajetória daquele que é considerado o maior repórter da história da imprensa no Brasil, Joel Silveira. Para sorte dos sergipanos, tão carentes de homens notáveis, além dos políticos medalhados que frequentam banquetes nos salões da Corte, em Brasília. Joel é nascido em Lagarto, criado em Aracaju, onde viveu até os 18 anos.

O documentário apresenta o resultado de vinte anos de trabalho de Geneton em entrevistas e conversas com Joel, de quem se tornou, além de amigo, parceiro em um livro, pelo menos. A Víbora, apelido dado por Assis Chateaubriand, o todo poderoso dono dos Diários Associados e da Rede Tupi de Televisão, destila sua fumegante verve contra a mediocridade vigente na política, na imprensa e na sociedade de forma geral, contra os defensores da neutralidade jornalística, que Nelson Rodrigues chamou de “idiotas da objetividade”.

Conta, por exemplo, da solidão que sofreu na Aracaju dos anos 80, quando voltou a viver aqui, a convite do governo do Estado, para ocupar a Secretaria da Cultura. Segundo ele, a aridez da cidade era tanta que só tinha uma pessoa com quem podia conversar, o então arcebispo Dom Luciano Cabral Duarte. “Ele era culto, cultíssimo, e a gente tinha um acordo: nem eu falava de mulheres, nem ele falava de Deus”, relembra Joel, que em outras entrevistas confessou que os assuntos discutidos versavam de música (clássica, evidentemente), literatura e filosofia.

Formado em jornalismo há pouco tempo, e ainda exercendo minha tola fúria na então alternativa e vibrante Folha da Praia, fiz a besteira que me acompanhou por quase toda minha vida: comprar pra mim a briga dos outros. Do nada, cutuquei a serpente com vara curta e recebi de volta um assustador bilhete, timbrado, com o poderoso nome de Joel Silveira no canto da folha, com a ternura digna da fama: “Você ainda vai engolir esta merda”. Não engoli. Beberrão, como sempre fui, mulherengo, como sempre admirei, aquele homem infinitamente maior do que eu se tornou meu amigo.

Ainda guardo fresca na memória a imagem de um Joel maestro, ouvindo Mozart às quatro da manhã e regendo uma orquestra imaginária no quintal do poeta Amaral Cavalcante. Era minha despedida para uma de minhas diásporas. Ganhei de presente uma fita K-7 de Mozart e a conversa com o maior repórter da imprensa brasileira, entre várias rodadas de uísque. Esse jornalista extraordinário, destemido e desprendido, o sujeito que fez da reportagem jornalística quase uma obra de arte.

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(*) Luciano Correia - Jornalista e professor da Universidade Federal de Sergipe.

Texto e imagens reproduzidas do site: sosergipe com br

sábado, 2 de agosto de 2025

Morre o jornalista José Roberto Guzzo, aos 82 anos

Texto publicado originalmente no site G1 GLOBO, de 2 de agosto de 2025 

Morre o jornalista José Roberto Guzzo, aos 82 anos

Ex-diretor de redação da revista Veja, ele era colunista da revista Oeste, da qual foi um dos cofundadores, e do jornal Estadão. J.R. Guzzo, como assinava, foi vítima de infarto.

Por Redação TV Globo e g1 SP

O jornalista José Roberto Dias Guzzo morreu na madrugada deste sábado (2) em São Paulo. Aos 82 anos, era considerado um dos grandes nomes do jornalismo do país.

Segundo nota divulgada pela revista digital "Oeste", da qual era um dos fundadores, colunista e integrante do conselho editorial, a causa da morte foi um infarto. Ele também era colunista do Estadão.

O velório será no Cemitério Congonhas neste sábado, e o sepultamento está previsto para domingo (3).

J.R Guzzo, como assinava seus textos, começou a carreira em 1961 no jornal Última Hora. Cinco anos depois, foi trabalhar no Jornal da Tarde, do Grupo Estado, e chegou a ser correspondente em Paris.

Foi, no entanto, na Editora Abril onde passaria a maior parte da vida profissional. Em 1968, ele entrou na Veja como editor de internacional e depois foi correspondente em Nova York.

Em 1976, assumiu a direção da revista, cargo que ocupou até 1991. Nesse período, conseguiu tirar a publicação do vermelho e levá-la a ficar entre as maiores revistas semanais de informação do mundo. Desde 1988, Guzzo também passou a acumular a diretoria-geral da Exame.

Após deixar a Veja em 1991, o jornalista tirou um ano sabático antes de voltar à Exame, como diretor editorial e publisher. Ele voltou à Veja em 2008 como colunista e lá permaneceu até 2019.

Em 2020, ajudou a fundar a revista Oeste e se tornou destaque entre o público conservador. No ano seguinte, passou a escrever colunas para o Estado de S. Paulo em 2021.

Em nota, a revista Oeste se referiu a Guzzo como o "mais brilhante profissional do país".

"Vítima de um infarto, morreu às 5h deste sábado, 2, o jornalista José Roberto Dias Guzzo. Aos 82 anos, J.R.Guzzo, como assinava os textos que publicou, era o mais brilhante profissional do país. Paulista da capital, Guzzo consagrou-se quando, ocupando o cargo de diretor de redação da Veja, comandou o crescimento da revista que alcançaria a terceira tiragem do mundo. Um dos fundadores de Oeste, integrante do conselho editorial e seu principal colunista, o melhor de todos nós partiu depois de contribuir decisivamente para o sucesso da revista. Sem ele, Oeste não seria o que é."

Texto compartilhado do site: g1 globo com/sp/sao-paulo

quarta-feira, 30 de julho de 2025

Morre Sinval de Itacarambi, fundador da Revista IMPRENSA

Crédito da foto: Portal IMPRENSA

REGISTRO de notícia publicada em 05/08/2024

Publicado originalmente no site do Portal da REVISTA IMPRENSA, em 5 de agosto de 2024

Morre aos 81 anos Sinval de Itacarambi Leão, fundador e editor da Revista IMPRENSA

Mais velho entre os seus cinco irmãos, veio ao mundo, na zona rural de Araçatuba, interior de São Paulo, com o sobrenome trocado. A ascendência paterna, uma corruptela de Itákurubi, que significa “seixos”, de origem Tupi-Guarani e nome de uma cidade do norte de Minas Gerais, a margem esquerda do Rio São Francisco, acabou sendo deslocada para o meio. 

De origem humilde, encontrou na igreja a oportunidade para o conhecimento. Foram 14 anos de dedicação à Ordem de São Bento, a que pertencem os monges beneditinos. As experiências transformadoras da infância para a adolescência e, depois, para a vida adulta, foram atravessadas pelos dogmas morais e espirituais da fé cristã. O batismo extramuros do internato, iniciado alguns anos antes na faculdade de Filosofia, emergiu quando se desligou do monastério.

Eram tempos difíceis os da ditadura militar brasileira. Preso duas vezes durante o regime de exceção, em 1969 e 1971, e brutalmente torturado em ambas as passagens por associação com a ALN (Ação Libertadora Nacional), fundada por Carlos Marighella, e por conspirar contra o país, acabou enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Do ponto de vista factual, foi preso a primeira vez por sua amizade com os frades dominicanos. 

Não bastasse o histórico dos amigos com os quais convivia, a editora Vozes, onde trabalhava, se posicionou contra o regime e publicou obras importantes nos anos de repressão. Com esse histórico, os militares estavam certos da conexão do jornalista com o comunismo. Conseguiu a liberdade, em definitivo, em 1971, respondendo a processo do Estado por ser membro da ALN. 

Guardou durante muitos anos o recorte do jornal Diário Popular (hoje Diário de S.Paulo), que publicou a decisão do julgamento, com destaque para a condenação dos freis Carlos Alberto Cristo e Yves dos Amaral Lesbaupin. No texto, o periódico citava a absolvição de Sinval de Itacarambi Leão por unanimidade do tribunal “por carência de provas”, processo em que também foram inocentados o filósofo dominicano Roberto Romano, preso com Sinval, e a amiga e jornalista Rose Nogueira.

Atuou como repórter nas revistas Realidade e Visão e passou rapidamente pela Folha de S.Paulo. Migrou para o Departamento de Pesquisa de Mídia da agência de publicidade Lintas, a convite de Fátima Pacheco Jordão, e de lá seguiu para a DPZ. Ficou na agência até os militares reaparecerem para buscá-lo. O erro foi o local: tinham o endereço da Lintas. Os amigos o avisaram e, dessa vez, não esperou ser capturado, pegou a família e “saiu de férias”.

A situação começa a melhorar a partir de 1974, ao assumir como diretor de Serviços de Marketing na Rede Globo, posto que exerceu até 1982 quando foi transferido como diretor Comercial da Globo Minas. Criou e coordenou projetos relevantes, como o prêmio “Profissionais do Ano”, em vigor até os dias de hoje. 

Ao sair da emissora, lançou em 1987 a Revista IMPRENSA, ao lado dos jornalistas Paulo Markun, Dante Matiussi e Manoel Canabarro, da qual foi o único fundador a permanecer e dar continuidade ao projeto. 

Foram 38 anos à frente da publicação, período em que IMPRENSA recebeu dois Prêmios Esso de Jornalismo, em 1987 e 1994, o principal reconhecimento da categoria. O exercício contínuo de valorização da vida e dos direitos humanos, a promoção de debates e a criação do Prêmio Líbero Badaró de Jornalismo (em 1989), pró-martir da liberdade de imprensa, e do Troféu Mulher Imprensa, o primeiro a reconhecer o trabalho feminino no jornalismo, são alguns exemplos dos valores que sustentaram sua conduta. Recebeu com orgulho a Medalha Juscelino Kubitschek (2013) por serviços prestados à cultura de Minas Gerais.

Em 2012, iniciou quadro de insuficiência cardíaca, que aos poucos gerou outras comorbidades. Desde então, teve como médico e amigo o cardiologista Dr. Renato Azevedo Junior, ex-presidente da Associação Médica do Hospital Samaritano de São Paulo, do qual integra o corpo clínico desde 1993. 

Trabalhou diariamente em seu escritório até o início do ano, mantendo uma rotina de leitura voraz de clássicos, atento as últimas notícias e aos jogos do Corinthians. Sempre acompanhado da medalha de São Bento envolta ao pescoço. Deixa a esposa Ruth, companheira de mais de 50 anos, quatro filhos, os quais reestabeleceu o sobrenome trocado no passado, e seis netos. 

Texto e imagem reproduzidos do site: portalimprensa com br

terça-feira, 29 de julho de 2025

Jornalistas prestam homenagens ao Sinval de Itacarambi

Legenda da foto: Fotolito de capa fictícia feita pelos colaboradores de IMPRENSA nos anos 90

Artigo compartilhado do site do PORTAL IMPRENSA, de 12 de agosto de 2024 

Jornalistas prestam homenagens ao Sinval de Itacarambi Leão, fundador de IMPRENSA

Redação 

Pelas redes sociais, rádio, tv e sites e mensagens, jornalistas de todo o Brasil prestaram homenagens e agradecimento ao jornalista e publicitário Sinval de Itacarambi Leão, que faleceu em 5 de agosto, em decorrência da insuficiência cardíaca.

O jornalista Carlos Sardenberg dedicou o programa da CBN Brasil ao Sinval, destacando a importância da Revista IMPRENSA e o pioneirismo do Troféu Mulher IMPRENSA. Já o Jornal da Band relembrou sua trajetória profissional e contribuições ao jornalismo. 

“Sinval viverá sempre na minha memória como um colega que eu admirava, com o qual aprendi muito, e uma pessoa digna e generosa. Através das décadas de dedicação e trabalho árduo na Revista Imprensa e no Portal Imprensa, Sinval criou um legado importante: a tradição da necessária cobertura da indústria jornalística brasileira, que tanto beneficia jornalistas, executivos de mídia, professores e alunos de jornalismo”, escreveu o professor Rosental Calmon Alves do Knight Center

Em nota a AJOR diz que “sua contribuição para o desenvolvimento do campo jornalístico no país, bem como para a defesa da democracia e da liberdade de imprensa, sempre será lembrada”. A ABI e o Sindicato dos Jornalistas expressaram solidariedade aos familiares e amigos e homenagearam este profissional que deixou sua marca no jornalismo.

A Agência Aids relembra da consciente da importância da pauta aids nas publicações que Sinval dirigiu. Ele concebeu o primeiro fórum nacional para discussão do tema. “O Sinval Itacarambi Leão criou em 1998 o primeiro Fórum Aids, Imprensa e Cidadania. Ele me convidou para ser curadora do evento. Foi a primeira vez que, no Brasil e na América Latina, reunimos jornalistas, ativistas, gestores e profissionais da área da saúde para pensarmos conjuntamente sobre a pauta HIV/Aids. Um momento importantíssimo de reflexão. Daquela reunião, veio a ideia de fundar uma agência de notícias sobre o tema. Percebi que a pauta merecia uma comunicação diária, feita por profissionais de comunicação. O evento foi o embrião para a criação da Agência Aids”, diz Roseli Tardelli.

O publicitário Fernando Vasconcelos lamentou a perda do amigo e profissional. “Como presidente do Sindicato dos Publicitário e colunistas, fui convidado a participar por quatro anos do prêmio Profissionais do Ano, criado por Sinval de Itacarambi. Foi um profissional competente, incansável e guerreiro em defesa da sua revista Imprensa.”

O jornalista Silvestre Gorgulho compartilhou mensagem enviada por Sinval referente à Medalha Juscelino Kubitschek, recebida em 2013. “Meu caro Silvestre: Recebi uma Comenda abençoada. Maria Estela Kubitschek e o governador Antônio Anastasia resgataram para o meu coração o tempo maravilhoso que vivi em Minas como Diretor da TV Globo. Tanto quanto o jornalismo que fiz em Minas, pude relembrar os festivais de música e teatro que realizei em terras mineiras. Ao receber a Medalha JK me lembrei, sim, na força que dei às iniciativas culturais de Minas. Mas, muito mais importante, me lembrei do quanto eu ganhei em emoção, em carinho e como profissional da imprensa nessa nossa Minas Gerais.”

Mural:

“Senti muito a morte de Sinval, um amigo antigo e muito querido. Um pregador do jornalismo de qualidade superior.”

Ricardo Noblat

"Estou sempre em pensamento com vocês por um homem que fez tanto pelo jornalismo e pelas mulheres." Sônia Blota (Band News)

“Lamento profundamente, ele foi uma pessoa incrível, cheio de ideias, empreendedor, batalhador.” 

Eliane Catanhede (Globo News)

"Meus sentimentos, o Sinval era um grande cara, um amigo como poucos. E um pai que adorava a família, de quem tinha um orgulho ilimitado. Com ele passei momentos inesquecíveis."

Milton Blay (França)

Fez uma história importante nas lutas pela democracia e a imprensa”. 

Verónica Goyzueta (SUMAÚMA Jornalismo)

"Que tristeza. Sinval foi um defensor do jornalismo e da liberdade e da liberdade de expressão. Sabia valorizar os jovens e as mulheres jornalistas."

Katia Brasil (Amazônia Real)

“Sinval, jornalista fundador e editor da revista Imprensa, passou como profissional por vários órgãos da imprensa como TV Globo, Folha e tal. Foi briguento em todos os sentidos. Gostava do que era bom: Whisky, por exemplo.”

Assis Angelo (Blog)

“Fomos colegas em estudos de teologia no IFT em 1966, militantes da Executiva Nacional dos Estudantes de Teologia em 1967, companheiros de militância em grupos de esquerda que lutavam contra a ditadura. Sinval é conhecido por suas realizações no jornalismo, particularmente pela criação da revista Imprensa. Quando saiu da prisão, não conseguia encontrar trabalho, até ser descoberto po Carlito Maia que o levou para a Rede Globo para ser diretor de marketing do grupo.”

Jarbas Novelino Barato (Educador)

“Nossa gratidão pelo extraordinário legado do Sinval e da revista Imprensa”.

Sylvio Costa (Fundador Congresso em Foco).

Texto e imagem reproduzidos do site: portalimprensa com br

'Somos presos políticos' - Perfil: Parte 3

Sinval com Tancredos Neves, naquela época, Governador de Minas Gerais

Artigo compartilhado do site PORTAL IMPRENSA, de 19 de agosto de 2024 

Somos presos políticos

Perfil: Parte 3

Isis Brum e Alexandra Itacarambi* 

Em dezembro de 1969, Sinval de Itacarambi Leão foi transferido para a cela 7 do Presídio Tiradentes

Levado com Paulo de Tarso Venceslau e Frei Tito, Sinval de Itacarambi Leão partiu para a nova carceragem. Todos os três feridos. Ao chegarem no presídio, Paulo de Tarso orientou-os a não se mostrarem intimidados porque os presos comuns costumavam abusar dos recém-chegados.

Havia um corredor imenso pelo qual a travessia dos prisioneiros ocorria sempre com insultos, gritaria e provocações. A cela deles, temporariamente, era a última. O presídio estava improvisando um novo local para acomodar os “terroristas”.

Antes, contudo, do início do corredor, Paulo de Tarso bradou a plenos pulmões:

- Nós somos presos políticos e estamos aqui para lutar por vocês. 

Houve um silêncio respeitoso enquanto caminhavam para o novo cárcere. Ao chegarem à cela, Frei Tito se apoiou em algo para ficar mais alto e declamou os versos de “Modinha”, de Geraldo Vandré, para um vão:

- Rosa, Hortência, Margarida / Tudo tem nome de flor / Passou pela minha vida / Foi mulher, tem meu amor.

Sinval lembra que o frade conhecia o presídio e sabia que a ala feminina estava acima da deles. Recorda também que as mulheres responderam, cantando “Bella Ciao”, uma canção italiana, entoada como um hino à liberdade e à resistência antifascista. 

Quando as mulheres finalizaram, um grupo do Partidão entoou a Intentona Comunista. Em seguida, Tito puxou um samba e os presos comuns fizeram a percussão.

Parecia um sopro de humanidade. Um modo de sobreviver, àquela altura, quase digno. Cantaram até às 22 horas quando foram silenciados pelo toque de recolher. A isso, Sinval estava habituado. Os anos na abadia o talharam para a disciplina.

No outro dia, e por ainda 18 meses, a realidade era sempre um choque. Apesar de não voltar a ser submetido à violência, estar preso, sem saber se seria solto um dia, era um tipo de tortura diária, lenta e contínua.

Cela 7

A planta do Presídio Tiradentes possuía seis celas masculinas. O local, porém, abrigou sete – esta última arranjada de improviso, para onde Sinval foi levado com os outros presos, no último andar da unidade. Antes, o espaço era ocupado pelo almoxarifado.

A cela 7 era espaçosa. Para lá, foram levados 25 beliches, mas nunca atingiu a capacidade máxima, enquanto o jornalista esteve preso. Para ele, a mudança isolou o grupo do restante da cadeia, como se ficassem em uma bolha, desconectados das outras celas.

Apesar de todos ali estarem presos por oposição ao regime militar, os grupos não se misturavam graças às discordâncias ideológicas, uma herança, aliás, que a esquerda brasileira continua a carregar.

Sinval não queria ser visto como ex-monge, embora todos os anos anteriores à vida que estava apenas começando, passou-os dentro do mosteiro. A pouca experiência com a militância, com a política e a vida, levou à alcunha de “cururu” que, na gíria dos presos, é uma pessoa “boba”, “trouxa”. 

Ele reconhece, hoje em dia, que realmente não tinha conhecimento profundo da obra comunista e aprendeu um pouco durante a prisão com quem se designava a conversar com ele, como o jornalista e artista Sérgio Sister, do então PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário), de quem se tornou amigo e admirador. 

Sobreviveu. Propunha jogos de futebol, abrindo espaço entre os beliches que sugeriu desmontar. Segundo ele, foi o primeiro a assumir o desejo de ter uma televisão para assistir aos jogos da Copa de 70. Para os marxistas, era o futebol, como a religião, o ópio do povo. Sinval saiu com o argumento de que o esporte, na verdade, era “o pio do povo”, pois, nesse momento, podia extravasar sem medo de ser preso. Não enfrentou resistência. Ele acredita que só faltava um bom argumento para ajustar as convicções mais diletantes ali presentes. 

Liberdade vigiada

Conseguiu a liberdade em 24 de março de 1971, respondendo a processo do Estado por ser membro da ALN.

Continuou a ser monitorado depois de sua saída até ser novamente detido, 4 meses depois, pela Oban. Desta vez, a denúncia foi contra sua esposa, Ruth, que fazia parte da militância no POC (Partido Operário Comunista). Sinval só foi preso à noite ao chegar em casa, na volta da Editora Abril.

O jornalista passou 30 dias sob tortura diária, ainda piores que da primeira vez, sem que nenhuma nova acusação fosse comprovada. Teve de ser liberado no dia 22 de agosto para comparecer à Justiça, onde seria julgado. Sinval conta que foi levado para um hospital militar para ser “consertado” e apresentar-se adequadamente ao juiz. Grávida do primeiro filho do casal, Ruth foi liberada antes do Natal a pedido do arcebispo de São Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns.

Não se tratava de um tribunal isento. O julgamento ocorria diante do Conselho Permanente da II Auditoria de Guerra, uma vez que os indiciados eram apontados como terroristas e comparsas de Marighella na tentativa de tomar o poder no Brasil.

A defesa foi realizada, nas palavras dele, com brilhantismo pelo resultado, e com verdadeiro terror pela linha adotada pela advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha. Com Sinval, foram julgados o filósofo dominicano Roberto Romano e a jornalista e amiga Rose Nogueira Clauset, presos à mesma época. “Nós três tivemos a mesma advogada. Ela fez uma defesa fantástica sobre o nazismo. Ficamos com medo, mas nós fomos absolvidos”, recorda.

Ainda viva, Rosa Maria se tornaria uma das grandes vozes em defesa dos presos políticos e dos direitos humanos. Foi a quarta coordenadora da Comissão Nacional da Verdade (CNV), da qual é membro desde 2012.

O jornal Diário Popular (hoje Diário de S.Paulo), datado de 15 de setembro de 1971, publicou a decisão em uma nota, com destaque para a condenação de 4 anos de detenção dos freis Carlos Alberto Christo, Yves do Amaral Lesbaupin e Fernando de Brito. O frade João Antônio Caldas Valença foi penalizado com 6 meses de prisão. Nesta nota, o jornal cita nominalmente a absolvição de Sinval de Itacarambi Leão por unanimidade do tribunal “por carência de provas”.

Após ser absolvido, Sinval procurou manter o foco no trabalho e no sustento da família que estava começando. Mesmo absolvido, ainda era difícil conseguir emprego com seu histórico. 

Sobrevivência e recomeço

Em 1971, foi repórter nas revistas Realidade e Visão e passou rapidamente pela Folha de S.Paulo. No ano seguinte, foi contratado como chefe do Departamento de Pesquisa de Mídia da Lintas Publicidade pela Fátima Pacheco Jordão, nas palavras de Sinval, “a maior especialista de pesquisa de mídia deste Brasil”. 

Seguiu para a DPZ para exercer o mesmo cargo, ganhando mais, época em que conheceu o publicitário Carlito Maia. Permaneceu na agência por mais um ano até os militares reaparecerem para buscá-lo. O erro foi o local. Os agentes tinham o endereço de trabalho na Lintas. Os amigos o avisaram e, dessa vez, não esperou ser capturado. Retirou o dinheiro do banco, pegou a família e “saiu de férias”.

A situação melhorou a partir de 1974, quando assumiu como diretor de Serviços de Marketing na Rede Globo, posto que exerceu até 1982, período que trabalhou com Carlito. O Exército chegou a ir atrás dele. “Mas o doutor Roberto Marinho dizia que dos comunistas dele, ele cuidava”, conta Sinval. Em seguida, completa a frase: “O doutor Roberto nunca falou esta frase. Quem inventou foi o meu amigo, Otto Lara Resende”. Se não acalentava pela mentira, ao menos, gerava certa empatia pela situação ou risos pelo temperamento cínico-afetuoso de Lara Resende.

No período em que trabalhou na Globo, criou e editou a revista Mercado Global, em 1974. Em 1977, estagiou na ABC Network de Nova York e, no ano seguinte, criou e coordenou o Prêmio Profissionais do Ano, que reconhece o talento dos profissionais de marketing no Brasil até hoje. No final do ano passado, foi realizada a 45ª edição.

Em 1982, foi transferido para a Globo Minas para ser diretor Comercial. “Aí, o clima já era outro. Tancredo Neves era governador do estado mineiro e negociaria, depois, a transição para a redemocratização. Ao mesmo tempo, as fissuras no governo ditatorial cresciam e os movimentos pelas Diretas Já ecoavam em todo País”, recorda. Ficou no cargo até 1986.

No mesmo ano, tornou-se sócio da Interscience Serviços de Marketing e, em 1987, fundou a Revista IMPRENSA, com os jornalistas Paulo Markun, Dante Matiussi e Manoel Canabarro, da qual foi o único a permanecer como diretor e editor.

À frente da IMPRENSA, resistiu, tal como aprendeu com a vida, ao enfrentamento dos processos jurídicos, às crises financeiras, às mudanças tecnológicas ou políticas. Sinval ressalta com orgulho o trabalho de digitalização completa da publicação, antes com exemplares antigos faltantes. O atual acervo digital foi construído como forma de preservar a história da imprensa brasileira das últimas décadas, disponível ao interesse público.

O exercício contínuo de valorização da vida e dos direitos humanos, a promoção de debates e a criação do Prêmio Líbero Badaró de Jornalismo (em 1989), pró-mártir da liberdade de imprensa, e do Troféu Mulher Imprensa, o primeiro a reconhecer o trabalho feminino no jornalismo, são exemplos dos valores que sustentaram a sua conduta. 

A lista de prêmios recebidos reafirma a contribuição ao jornalismo e à sociedade. Em destaque, recebeu dois Prêmios Esso de Jornalismo, em 1987 e 1994, e dois prêmios Aberje, em 2005 e 2006. Em 2013, foi consagrado com a Medalha Juscelino Kubitschek por serviços prestados à cultura de Minas Gerais.

“Nomen est omen”

Minas Gerais foi importante em sua vida, era o local de seus ancestrais indígenas. 

O Presídio Tiradentes, que por contradição tinha o nome do inconfidente mineiro, começou a ser desativado, devido a uma forte chuva em São Paulo, no mesmo dia do nascimento de seu primogênito, Carlos, em homenagem a Marighella.

“Nomen est omen”. Sinval acreditava no destino do nome. Na redação de IMPRENSA, repetia máximas como “mate o homem, mas não erre o nome”, ou outras em latim “quot abundat, non nocet”, em tradução livre “o que é de mais, não prejudica”, exceto os adjetivos. 

No processo do Estado era identificado como Valdo. Companheiros da cela 7 o chamavam de Capitão Ipanema, por ter sido preso por lá. Já no monastério, Sinval de Itacarambi Leão era Dom Teodoro.

Este perfil foi publicado no Portal IMPRENSA em 3 partes

*A jornalista Isis Brum entrevistou o Sinval de Itacarambi Leão entre novembro e dezembro de 2023. O texto teve a colaboração e edição de Alexandra Itacarambi.

Texto e imagem reproduzidos do site: portalimprensa com br

'O seu chefe está morto!', por Isis Brum - Perfil: Parte 2

Julgamento dos réus acusados de subversão do grupo de Carlos Marighella. Sinval, que estava implicado no processo, foi absolvido. Publicado no Jornal Diário Popular (hoje Diário de SP) em 15/09/1971 (Crédito: Arquivo Pessoal).

Artigo compartilhado do site do PORTAL IMPRENSA, de 16 de agosto de 2024 

O seu chefe está morto!

Perfil: Parte 2

Por Isis Brum* 

Durante a ditadura, Sinval de Itacarambi Leão foi preso no fatídico dia da emboscada de Marighella

Do ponto de vista meramente factual, Sinval foi preso por sua amizade com os frades dominicanos, que conheceu durante a Faculdade de Filosofia, pois assegura nunca ter sido membro efetivo da ALN (Ação Libertadora Nacional).

Ainda mais progressistas que os beneditinos, os religiosos da Ordem de São Domingos também eram formados sob uma base filosófica e intelectual tão rica quanto a teológica. Desobrigados da vida em clausura, ao contrário da maioria das ordens monásticas, os dominicanos podiam ingressar no ensino superior e muitos deles cursaram a USP (Universidade de São Paulo). Também podiam trabalhar fora dos muros do convento que, em São Paulo, ficava no bairro das Perdizes, na zona oeste da capital.

Essa vivência lhes permitiu participar do debate político à medida que se tornava cada vez mais comum a criação de grupos da JEC (Juventude Estudantil Católica). Posteriormente, os dominicanos fundaram a Ação Popular, que atuou na clandestinidade, ajudando membros da militância a fugir ou a se esconder, entre os quais, os filiados à ALN. 

A religião e a política desaguavam no mesmo oceano de propósitos, aonde os alcunhados cristãos socialistas foram se banhar. Sob essa perspectiva, Jesus era abordado e admirado em sua obra social e revolucionária, para além dos dogmas do catolicismo oficial realizzato in Vaticano. Como irá repetir Frei Betto, inúmeras vezes, em artigos e entrevistas pós-ditadura, Cristo foi perseguido, censurado, torturado e morto em um processo político por desafiar o Império Romano e, mais ainda, a conduta imoral dos fariseus, as autoridades religiosas das quais Cristo discordava, que exploravam tanto quanto os “filhos de César” o povo pobre, doente e analfabeto. Os frades se reconheciam nesse Jesus caridoso e insurgente e procuravam se inspirar em seus passos até que um deles esbarrou com o de Marighella.

Não bastasse o histórico dos amigos com os quais convivia, a editora Vozes, onde Sinval trabalhava há um ano, se posicionou contra a ditadura militar e publicou corajosamente obras importantes nos anos de repressão.

Com esse histórico, os militares estavam certos da conexão do jornalista com a militância armada.

Sinval não conheceu Carlos Marighella pessoalmente, embora soubesse quem ele era. Para a esquerda, um líder revolucionário admirável. Para o Estado, terrorista e inimigo número 1 do regime, sobretudo, depois do sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick orquestrado ente os membros da ALN e do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro).

O grupo conseguiu o que queria: trocar Elbrick pela libertação de 15 presos políticos e a leitura em rede nacional do manifesto revolucionário escrito por Marighella. A partir do dia em que o diplomata foi solto, a caçada implacável à militância iniciou-se.

A caçada

Há muita literatura sobre este período, desde “O que é isso, companheiro?”, de Fernando Gabeira, “Batismo de Sangue: guerrilha e morte de Carlos Marighella”, de Frei Betto, a “Marighella: o guerrilheiro que incendiou o mundo”, de Mario Magalhães. Sem contar os documentários, estudos científicos, as reportagens investigativas e todo trabalho da Comissão da Verdade.

Nesses registros históricos, é possível encontrar detalhes e perspectivas esclarecedoras (outras nem tanto assim) que confrontam as versões oficiais produzidas pelos militares durante os anos de ditadura.

O envolvimento de Sinval com o episódio, conforme o relatário do Dops, começa a partir da prisão de alguns membros da ALN e da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), como Paulo de Tarso Venceslau, em 1º de outubro de 1969, e Izaías do Vale Almada, detido há mais tempo. Todos submetidos a dias consecutivos de intensa tortura. Participante do sequestro do diplomata americano, Venceslau conta à Folha de SP, em junho de 1998, que tinha um telefone do Convento dos Dominicanos anotado no talão de cheques e para não entregar os dominicanos, falou que o contato era o Frei Oswaldo Resende que estava na França.

Pelos depoimentos, agentes infiltrados e escutas telefônicas, o departamento obteve os nomes de Yves do Amaral Lesbaupin, o Frei Yves, e de Fernando de Brito, o Frei Fernando, além de Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, que mantinha contato regular com Marighella.

Julgamento dos réus acusados de subversão do grupo de Carlos Marighella. Sinval, que estava implicado no processo, foi absolvido. Publicado no Jornal Diário Popular (hoje Diário de SP) em 15/09/1971

Ainda segundo o relatório do Dops sobre a operação, entregue incompleto à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, os militares concluíram que era “evidente o comprometimento desses clérigos com o movimento subversivo liderado por Carlos Marighella para a tomada do poder, por meio violento, através da luta armada”. O Convento dos Dominicanos foi considerado uma base operacional de Carlos Marighella e posto sob vigilância ininterrupta até ser invadido no dia 3 de novembro de 1969.

Foi então que os militares armaram um encontro entre Marighella e os freis Yves e Fernando, como conta a história. Segundo a entrevista publicada em 1996, Lesbaupin afirma “não fomos só nós os utilizados para pegá-lo. Teve algo mais.”

Diga-me com quem andas

Ainda monge, Sinval decidiu cursar Filosofia no Instituto de Filosofia e Teologia da Faculdade Sapientiae, onde estudou de 1965 a 1967. No ?ltimo ano, conheceu os frades Tito de Alencar Lima, Carlos Alberto Libânio Christo, Magno Vilela, Luiz Felipe Ratton e Yves do Amaral Lesbaupin, de quem se tornou mais próximo.

Com eles, travou conversas sobre política, tornou-se um cristão socialista e foi convidado a fazer parte da ALN por Lesbaupin. Em julho de 1969, durante sua passagem pelo Rio de Janeiro, Frei Yves e Sinval encontraram-se pessoalmente e o frade lhe disse que sua função estaria relacionada com o setor de imprensa da organização e seria necessário esperar algum tempo, porque o órgão não estava estruturado na capital carioca. Os frades integravam a Editora Duas Cidades em São Paulo e tinham o objetivo de expandir a oposição ao regime militar para o Rio de Janeiro, o que seria feito pela Vozes por Sinval.

O novo contato ocorreu em fins de outubro, quando conversaram por telefone e o amigo Yves comunicou sua ida ao Rio no dia 2 de novembro, sendo preso assim que desembarcou. O momento era bastante tenso e chegou a orientar os companheiros do convento a procurarem por ele se desaparecesse. 

Os frades militantes sabiam que o contato no Rio era Sinval. Ao ser informado do sumiço do amigo, o jornalista contou que passou a procurá-lo, no entanto, acabou preso no dia 4, dois dias depois pela Oban no Rio, enquanto Frei Tito era preso em São Paulo. Era o fatídico dia da emboscada de Marighella. 

O seu chefe está morto! 

Há 11 anos sem ganhar do Santos, o Corinthians tinha dominado o jogo. Não muito longe do estúdio, cerca de 40 policiais, sob o comando do delegado Fleury, foram designados para a Alameda Casa Branca, altura do número 806, onde Marighella se encontraria com os freis Yves e Fernando.

No intervalo do jogo, o locutor anunciou: - Foi morto pela polícia o terrorista Carlos Marighella. O estádio gritou eufórico pela notícia. Na delegacia, os  policiais comemoravam o sucesso da operação:

- O seu chefe está morto! O seu chefe está morto!

Sinval não se lembra de ir para a sala de tortura naquela noite e, sim, dois ou três dias depois. A partir do momento em que foi levado para a primeira sessão, foi submetido vezes seguidas ao pau de arara, eletrochoque em todas as partes do corpo, a espancamentos com mangueira de borracha, aplicação de telefone (tapas simultâneos nos dois ouvidos) e afogamentos.

As sessões foram comandadas pelo delegado Fleury, considerado um dos policiais mais cruéis do regime de exceção e o chefe do Esquadrão da Morte em São Paulo. Exigia de Sinval uma lista de pessoas envolvidas na organização e a confissão de sua participação no “grupo terrorista”. 

O jovem de 26 anos insistia em sua inocência e alegava que fora preso antes de realizar qualquer tarefa. Questionado pelo delegado se faria algo que Marighella lhe pedisse, ouviu “Sim, eu faria”, como resposta. Neste dia, foi intensamente espancado.

O seu depoimento foi registrado em dia 21 de novembro. Sinval acredita que os torturadores acabaram se convencendo de que ele não tinha ligação com a militância. No mês seguinte, foi transferido para o Presídio Tiradentes, usado como prisão política desde a Era Vargas.

© Imprensa Editorial

Este perfil foi publicado no Portal IMPRENSA em 3 partes

* A jornalista Isis Brum entrevistou o Sinval de Itacarambi Leão entre novembro e dezembro de 2023. O texto teve a colaboração e edição de Alexandra Itacarambi.

Texto e imagem reproduzidos do site: portalimprensa com br

segunda-feira, 28 de julho de 2025

'Um destino nada convencional', por Isis Brum - Perfil: Parte 1

Legenda da foto: Sinval no escritório de IMPRENSA em 1988

Artigo compartilhado do site do PORTAL IMPRENSA, de 13 de agosto de 2024

Um destino nada convencional

Perfil: Parte 1

Por Isis Brum* 

Inquieto e dono de uma intensa produção intelectual, a motivação de Sinval de Itacarambi Leão foi a busca incessante pela liberdade

Os livros sempre foram uma ameaça. Em qualquer tempo. Em qualquer governo autoritário. Fossem eles manifestos, romances ou textos sagrados. Restritos na Idade Média, queimados nas inquisições, censurados em todas as ditaduras, desprezados nas incoerentes democracias de ultradireita. O perigo deles é saltar do campo das ideias para a vida real: seja Dom Quixote, seja a saga de Jesus Cristo. Certas leituras causam uma intranquilidade para a vida, atiçam um tipo de rebeldia que põe em risco as conveniências – até mesmo alguns destinos.

O jornalismo agrega não só todas essas virtudes como se consolida como força de combate à corrupção do poder público, à censura, às tentativas de manipulação da verdade e de enfrentamento de governos brutais em ditaduras à direita e à esquerda. 

Assim, a Revista IMPRENSA, fundada em 1987 por Sinval de Itacarambi Leão e outros três sócios, e da qual é o único diretor, nasceu com o propósito claro de salvaguardar os valores que norteiam a boa prática da profissão, combater injustiças contra a categoria, onde quer que ocorram, e promover o debate constante da categoria impactada pela digitalização, pelas fake news e pela concorrência com as redes sociais e com os influenciadores.

Até aqui, não há dúvidas, de que esta é uma trajetória construída com talento, trabalho e muitas parcerias com jornalistas e comunicadores que Sinval conquistou ao longo de sua carreira. Aos 81 anos, ele afirma que “o que traz notoriedade às pessoas é fazer as coisas”. “Talvez, seja a minha forma de lidar com a realidade”, afirma, em tom de incerteza, quando precisa expor-se de dentro para fora. 

O jornalista faz essas reflexões em meio aos relatos de sobrevivência à ditadura militar brasileira. Foi preso duas vezes durante o regime de exceção, em 1969 e 1971, e cruelmente torturado por associação com a ALN (Ação Libertadora Nacional), fundada por Carlos Marighella, e por conspirar contra o País, tendo sido enquadrado na Lei de Segurança Nacional.

Em liberdade vigiada, enfrentou dificuldades para arrumar trabalho, fosse pelos antecedentes criminais, fosse pelo temor dos empregadores em contratar um inimigo do Estado. Depois, para permanecer empregado em razão da perseguição sofrida pelo Exército.

A sua obra jornalística acaba sempre por refletir uma necessidade inata para a liberdade de pensar, opinar, refletir e construir. Sem que horrores como a tortura voltem a ameaçar a expressão de qualquer outro ser humano.

O processo antes da pessoa

- Sinval de Itacarambi Leão. Processo ALN, novembro de 69 - disse o jornalista e escritor Elio Gaspari a Sinval ao ser apresentado por João Roberto Marinho, em São Paulo, na celebração dos 75 anos do Jornal O Globo. 

Sinval ficou estarrecido sobre como poderia ser reconhecido pelo seu processo. Mas certos episódios não se arrefecem na linha comprida do tempo, como aquela terça-feira em que o Corinthians receberia o Santos, no Estádio do Pacaembu, e Marighella seria assassinado pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), em ação planejada pelo delegado Sérgio Fernando Paranhos Fleury. Testemunhava, de dentro do Dops, algemado com Roberto Romano, alguns dos episódios mais significativos do regime militar. Foram deixados ali pelos militares da Operação Bandeirante (Oban), onde passou 40 dias incomunicável. 

Fazia pouco de mais de um ano que se mudara de São Paulo para o Rio de Janeiro. Passava por um período de muitas mudanças, uma vez que também havia deixado a Ordem dos Beneditinos e a vida monástica para seguir um caminho novo entre os homens comuns. 

Com a autorização concedida pelo Vaticano para o seu desligamento, foi recomendado pelos monges beneditinos para o trabalho na revista cultural da Editora Vozes, proprietária dos frades franciscanos, que ficava em Petrópolis, na região serrana do Rio.

Prenúncio de um destino nada convencional

Foram 14 anos de dedicação à Ordem de São Bento a que pertencem os monges beneditinos. As experiências transformadoras da infância para a adolescência e, depois, para a vida adulta, foram atravessadas pelos dogmas morais e espirituais da fé cristã. O contato com o mundo real, iniciado alguns anos antes em algumas viagens e na faculdade, só emergiu efetivamente quando se desligou do monastério, aos 25 anos.

O mais velho entre os seus irmãos, Sinval de Itacarambi Leão veio ao mundo com o sobrenome trocado. Seria o prenúncio de que o primogênito jamais teria um destino convencional. 

Nascido aos 23 de fevereiro de 1943, na zona rural de Araçatuba, interior de São Paulo, o cartório onde foi registrado trouxe para perto do nome as raízes indígenas da família paterna, originária da tribo dos Itacarambi - uma corruptela de Itákurubi, que significa “pedregulho, seixos”, segundo o Dicionário de Tupi-Guarani pesquisado por Sinval para descobrir suas raízes. Há uma cidade com esse nome, situada na margem esquerda do Rio São Francisco, ao norte de Minas Gerais. A tribo foi dizimada muito tempo antes de o distrito ascender a município em 1962. 

Pertencia a São João das Missões. A exemplo de São Miguel, no Rio Grande do Sul, era um povoado liderado por jesuítas com a missão de catequizar os indígenas entre os séculos 16 e 18. Os religiosos ensinavam a leitura e a escrita para as tribos inseridas nas missões, convertendo os gentios ao catolicismo.

A catequese praticada com os indígenas, naquele período, era bem diferente da que os monges beneditinos ensinariam aos seus devotos no século 20, entre eles, o jovem Sinval. Por volta dos 11 anos, morando na capital paulista com a família há um, estava decidido a seguir com os estudos, ainda que para isso tivesse de se inscrever no noviciado. Era a oportunidade que os religiosos católicos vinham entregar-lhe depois das missões colonizadoras – se é que deixaram de sê-la quando ao outro faltam opções e oportunidades.

Mesmo contrariado, o pai descobriu a vaga para novos alunos no Mosteiro de São Bento. E o menino, sem saber ao certo o que esperar, foi descobrir o seu caminho.

A Ordem de São Bento tem sua origem relacionada aos monges copistas da Idade Média. Por essa razão, possui vasto acervo de livros e documentos raros. Aliás, a biblioteca do Mosteiro, em São Paulo, é a mais antiga da cidade e possui um catálogo de mais de 115 mil exemplares, entre os quais, uma bíblia impressa por Gutenberg, considerado o pai da prensa, datada de 1496.

Havia a sessão dos livros proibidos, que Sinval leu, driblando a fiscalização dos monges, ao lado de um colega curitibano, recém-chegado do Rio, o Paulo Leminski. Leminski ficou no colégio São Bento por apenas um ano, mas a amizade entre os dois durou até a morte do poeta, em 1989. Leram às escondidas as obras de Jorge Amado. 

Para os beneditinos, a formação intelectual é tão valiosa quanto a teológica, assim como o hábito da leitura e a postura disciplinar são pilares da Ordem, cujo lema é “ora et labora et lege”, isto é, “oração, trabalho, estudo”. 

Havia muito silêncio e introspecção no Mosteiro. Os clérigos eram um pouco menos conservadores se comparados a sacerdotes de outros grupos católicos, o que não os tornava menos rígidos e exigentes. Graças à inteligência, comportamentos podem ser copiados e até aprendidos. Difícil é naturalizá-los quando, em essência, o espírito alça voos em outras dimensões.

Sinval nunca foi uma personalidade fácil – e ele mesmo o admite. A perspicácia intelectual, continuamente enriquecida com a leitura e o estudo de métodos de pensamento crítico, o impeliam a questionar e, sempre que possível, com uma pitada de sarcasmo. 

Nem de longe era um mau menino, desrespeitoso. Ao contrário, era diligente, observador. Mas exigissem dele obediência a um conceito, regra ou pessoa com apenas um comando, e teriam dele o oposto. À medida em que crescia, a avenida pavimentada por dogmas de fé se estreitava. E sobre ela ainda trafegava o carro da história e do mundo para depois dos muros do Mosteiro.

Prova disso, foi a fundação do seu primeiro jornal, ainda no noviciado, nomeado El Paredón. O título era uma referência explícita ao paredão para onde os inimigos da Revolução Cubana (1959) eram enviados por Fidel Castro. A publicação incomodou parte dos clérigos, que cogitaram proibir uma nova edição.

Estava à beira de completar 81 anos ao conceder as entrevistas em que relatou o episódio. A expressão facial iluminou-se com uma graça adolescente de contrariar as autoridades por mera zombaria. 

Fez-me lembrar de uma cena, em um seriado antigo, em que o cineasta espanhol Luis Buñuel dizia, após filmar, à época, o escandaloso "Viridiana" (1961), que fazia filmes com tal temática (misturando sexo às concepções sagradas da Igreja Católica) porque diziam que não podia. Considerava-se um intolerante com o autoritarismo. “Sou antifanático (fanaticamente)”, escreveu em “Meu Último Suspiro”.

No colégio monástico, a conduta irreverente foi contornada por monges mais progressistas. No Dops, foi posto no pau de arara para ser surrado ao confrontar o delegado Fleury, que o interrogou algumas vezes.

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(1) Este perfil foi publicado no Portal IMPRENSA em 3 partes.

*A jornalista Isis Brum entrevistou o Sinval de Itacarambi Leão entre novembro e dezembro de 2023. O texto teve a colaboração e edição de Alexandra Itacarambi.

Texto reproduzido do site: portalimprensa com br