Publicado originalmente no site da revista Imprensa, em 11/03/2019
Livro resgata a memória da imprensa escrita no país
Por Marta Teixeira
Ao longo de quase 50 anos como jornalista, Aziz Ahmed
conviveu com muita gente que ajudou a construir a imprensa brasileira. Nos
bate-papos com amigos soube de histórias que nunca chegaram às páginas dos
jornais e quase ninguém tem conhecimento, ou melhor, não tinha.
Crédito:Reprodução
Nesta segunda-feira (11), Ahmed lança, no Rio de Janeiro, o
livro "Memórias da Imprensa Escrita", com relatos saborosos de uma
das épocas mais românticas do jornalismo. O livro, que também está
disponibilizado na versão e-book, tem ainda um recurso interessante e útil.
Cada capítulo possui um QR code que permite ao leitor acessar o vídeo com o
depoimento do entrevistado.
Entre os depoimentos está a última longa entrevista
concedida por Ricardo Boechat antes de sua morte, no dia 11 de fevereiro, em
acidente de helicóptero. Ele e Aziz conversaram durante mais de três horas,
resultando em um relato que ocupa cerca de 30 das 316 páginas do livro.
Em meio a suas recordações, Boechat falou sobre a vida
difícil da família nos tempos da ditadura. Para ajudar na renda, a mãe, dona
Mercedes, vendia enciclopédia e foi considerada provável contato do grupo
Tupamaros, que combatia a ditadura no Uruguai, com terroristas brasileiro
apenas por viajar com frequência a Montevidéu, onde tinha uma filha com doença
terminal.
"Ele fala que a casa deles era um verdadeiro drive thru
da repressão no início dos 70. Foram
várias batidas de agentes do Exército", relata Ahmed ao Portal IMPRENSA.
"Décadas depois, Boechat leu um relatório da inteligência interna que
apresentava a casa dele como esconderijo de armas e sua mãe como provável
contato entre o grupo Tupamaros e terroristas brasileiros."
O próprio Boechat foi vendedor de livros e chegou a fazer
teste para vender sepulturas, diz Ahmed. A mudança de vida começou quando tentou
fazer uma venda para um diretor do jornal Diário de Notícias. O executivo
acabou lhe dando uma indicação. "Ele foi trabalhar na coluna de Ibrahim
Sued, ficou 12 anos, saiu e fez a carreira que todos conhecemos."
Histórias não faltam para cativar o leitor. No total, 26
renomados jornalistas compartilham suas narrativas nas páginas do livro.
Algumas delas poderiam ter mudado o rumo da história do Brasil. Luiz Edgar de
Andrade, por exemplo, revela que antes de ser político e encantado com o
sucesso da radionovela O Direito de Nascer, o então jornalista Carlos Lacerda
queria ser autor de novela. "Como ele diz, se Lacerda tivesse sido o
Agnaldo Silva da época, Getúlio (Vargas) não teria se suicidado, Jânio
(Quadros) não teria renunciado, João Goulart não teria sido cassado e não teria
havido a ditadura porque Lacerda foi o grande mentor civil, o grande
articulador, de todos esses personagens", brinca o autor.
Ahmed compara seu livro como um colunão de jornal reunindo
muita informação, curiosidades e revelações. "Esse livro pega dos anos 50
até o início do século e fala muito da transformação que o jornalismo teve
daquele período romântico até hoje. É uma aula de jornalismo para quem quiser
conhecer os jargões e os sufocos que a gente passa. Não acho que falte
literatura sobre jornalismo. A proposta desse livro é contar o lado pitoresco
dos bastidores desse período", explica.
Os entrevistados são: Aluizio Maranhão, Anna Ramalho,
Aristóteles Drummond, Arnaldo Niskier, Bruno Thys, Cícero Sandroni, Fernando
Carlos de Andrade, Fuad Atala, Gilson Campos, Henrique Caban, Jarbas Domingos,
J.B. Serra e Gurgel, Jomar Pereira da Silva, José Silveira, Luiz Edgar de
Andrade, Milton Coelho da Graça, Miranda Jordão, Nelson Lemos, Nilo Dante,
Nilson Lage, Paulo Jerônimo, Pery Cotta, Pinheiro Junior, Ricardo Boechat,
Telmo Wamber e Walter Fontoura. "O mérito do livro, eu divido com eles, eu
só ouvi suas histórias", diz Ahmed modestamente.
Apesar de ter escrito o livro em aproximadamente seis meses,
o projeto todo demorou cerca de dois anos para ser concluído. Um motivo foi a
parte burocrática, a publicação do Ateliê de Cultura tem patrocínio da Delphos
e da Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, via Lei Municipal de
Incentivo à Cultura (Lei do ISS). Outra razão foi o minucioso trabalho de
checagem do autor.
A carreira jornalística de Ahmed começou em 1961, no Correio
da Manhã. Ex-chefe de reportagem dos jornais O Globo e Última hora e com
passagens em outras grandes redações, o ex-professor universitário do curso de
jornalismo fala com propriedade das transformações do setor nos últimos anos.
"O jornalismo hoje está completamente diferente do que era antes. Não sou
especialista nisso, mas acho que falta uma visão estratégica para ver como os
jornais devem ser produzidos em função das redes sociais. O que me atrai é a
leitura de profissionais que têm certa bagagem. A primeira coisa para a
juventude que chega à redação precisa é saber que ele está ali para informar.
Deixe o leitor chegar às conclusões dele."
Para os cursos de jornalismo o lançamento também vem
acompanhado de uma boa notícia. Ahmed planeja fazer palestras pelo país,
levando seus amigos para compartilharem essas e muitas outras histórias com as
futuras gerações de comunicadores brasileiros. Segundo ele, muitas instituições
já demonstraram interesse pelo projeto.
Serviço
O que: lançamento do livro "Memórias da Imprensa
Escrita", de Aziz Ahmed
Quando: 11/3, a partir das 17h
Onde: Auditório da Associação Brasileira de Imprensa (ABI)
Texto e imagem reproduzidos do site: portalimprensa.com.br
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