terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O Leitor Moderno é um Asno de Apartamento?



O Leitor Moderno é um Asno de Apartamento?
Por Dilson Ramos.*

O dia 31 de outubro de 2012 tende a se tornar um dia de luto para os jornalistas e uma data funesta para a imprensa brasileira. Foi numa quarta-feira que circulou pela última vez o 'Jornal da Tarde' (JT), o importante diário do Grupo Estado criado em 1966 com um padrão gráfico inovador e uma linguagem que logo conquistou leitores. O fechamento do JT, além de um marco triste para jornalistas e leitores, desencadeou uma discussão sobre o futuro dos jornais e lançou uma suspeita avassaladora em mim: estamos ficando burros? Estamos virando asnos de apartamento, o típico leitor de manchetes de portais de internet?

O hábito de ler jornal é secular. Ouvir o barulho da queda do jornal na varanda de casa sempre dá uma sensação de prazer na alma do leitor, de quem se sente um dos donos do mundo ao ler o diário no café da manhã. Essa cena que nos remete a muitos filmes de Hollyood se repete cada vez menos porque as novas gerações têm trocado a leitura de jornais por uma zapeada em sites. A oferta de portais  na internet é tão grande que não há tempo hábil para se debruçar sobre a notícia - que está em todos os lugares, às vezes com o mesmo título e conteúdo. Não sobra espaço para a leitura.

O JT foi sepultado numa cova rasa no museu da imprensa, abalado por uma doença que vinha a cada ano roendo suas forças: a falta de leitores. Quem imagina que os jornais sobrevivem apenas com a receita de publicidade não entende como pulsa o coração de um jornal impresso. A redação é o cérebro e o coração dessa estrutura. Quando as notícias deixam de interessar, e nas bancas é cada vez maior o encalhe, é o momento de colocar as barbas de molho e esperar pelo pior.

A morte do 'Jornal da Tarde' até podia ser uma morte anunciada, mas há sempre uma ponta de esperança por dias melhores, por uma virada de placar no segundo tempo da partida. Mas parece que caprichar na pauta, ajustar as manchetes e redesenhar o estilo não adianta, o hábito saudável e prazeroso da leitura de jornal não passa de pai para filho, não é transmitido de uma geração para outra. Aquele que não herda o gosto pela leitura de um diário é o mesmo que deixa livros mofando na biblioteca e se atualiza em sites, portais, blogs. A internet é sua única ferramenta de leitura.

A perda de leitores pelos jornais não é um fenômeno novo. O maior jornal do país, a 'Folha de São Paulo', alcançou na década de 90 a marca impressionante de 1,1 milhão de exemplares/dia. Ao apostar numa reforma gráfica ousada e na política de fascículos, a Folha bateu recordes de tiragem e virou um sucesso editorial. Foi o primeiro diário brasileiro a atingir a marca expressiva de um milhão de exemplares. Mas a chegada da internet, e a transformação dos hábitos de leitura, fizeram com que a Folha - a exemplo de outros grandes jornais - dessem marcha-ré. O ato de ler foi ficando um hábito de poucos e o que se viu foi o surgimento do leitor moderno, diria, com certo exagero e ressentimento, um asno de apartamento.

A 'Folha de São Paulo' hoje tem uma circulação diária de 280 mil exemplares. A média de tiragem deste ano é de 286 mil, contra 294 mil em 2010. Segundo o IVC (Índice Verificador de Circulação), a poderosa Folha está há dez anos perdendo leitores e, lógico, reduzindo a tiragem. Pesquisa feita em 2009 revelou que nos 20 maiores jornais do país houve uma queda de 6,9% na circulação. É um cenário aterrador para um para um país que sonha em conquistar uma vaga na primeira divisão dos países, o Primeiro Mundo, através de uma verdadeira revolução na educação.

Os pais de minha geração estão desapontados com seus filhos. Têm pouca disposição em ler. O livro que ganham permanecem com as páginas impecáveis, testemunho de um desdém que preocupa. O livro é recebido com festa e acaba numa gaveta, na estante ao lado do DVD de Justin Bieber ou Lady Gaga. Esse desapego pela leitura e um amor incondicional com a internet ameaçam editores e a imprensa escrita. Essa geração que não cultua desde cedo o hábito de ler pode tornar os jornais cada vez menores, obrigando-os a encurtar suas equipes para sobreviver ao desprezo pela letra impressa. Os asnos de apartamento que sepultaram o JT acompanham o correr apressado do relógio da modernidade, mas criam um mundo pobre e inculto.

*Foto e texto reproduzidos do Blog: dilsonramosjc.blogspot.com.br

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