Publicado originalmente no site Jornal do Dia Online, em
31/01/2015.
"Jornaleiro, olha o jornaleiro!..."
Por Rangel Alves da Costa*
O radinho de pilha já alardeava ao alvorecer, mas as
notícias precisavam ser confirmadas pelo jornal. Daí que era preciso abrir a
janela da frente para ouvir quando o menino passasse gritando o seu
inconfundível "Jornaleiro, olha o jornaleiro!...". Ali, estampadas
nas manchetes, esmiuçadas nas letras miúdas e inconfundíveis, estavam os fatos
e acontecimentos que espelhavam a realidade local e além-fronteiras.
O velho jornal, parecendo ainda aquecido pela pressão dos
tipos sobre a folha, com seu papel cheirando a tinta fresca, despertava um
interesse incomum. As mãos ávidas se lançavam sobre as dobras e os olhos
pulavam sobre as manchetes. Os editoriais mais pareciam discursos inflamados. E
nas páginas seguintes as tramas e os bastidores da política, as novas
revelações de escândalos que se prolongavam, as crônicas violentas de uma
sociedade aterrorizada. Já assim naqueles tempos e numa continuidade que foi
mudando somente as datas.
Desde aqueles idos, nos primeiros sinais da manhã, gritado
pelo jornaleiro, jogado na varanda casa, ainda sonolento nas bancas ou
encontrado pelas esquinas, o velho jornal testemunhando na escrita o que se
comentava de boca em boca ou se espalhava como notícia radiofônica. Não raro
que somente alguns pudessem ler as acusações, os escândalos e as revelações
melindrosas envolvendo partidos ou políticos, poderosos ou gente de nomeada na
sociedade, pois tudo era devidamente abafado com a compra de cada exemplar que
fosse encontrado.
E houve um tempo, diante de seu teor revolucionário, que
exemplares eram distribuídos às escondidas, em surdina, como se o impresso
contivesse sentença e pena para todo aquele que fosse encontrado com aquela
perigosa arma anárquico-comunista. De forte teor ideológico, direcionado a
militantes, servia praticamente para fortalecer o partidarismo ilegal e servir
de doutrinamento. Muitos jornalistas e militantes sofreram no cárcere por serem
flagrados carregando debaixo do paletó aquelas páginas subversivas.
Mil palavras e mil versões dos fatos podiam surgir, porém
nenhuma confirmação antes que a prova escrita estivesse estampada em letras
grandes nas manchetes. Então, somente depois que o jornal relatasse o
acontecido é que se poderia dizer de sua veracidade. Assim porque o jornal
sempre foi confiado pela apuração e pelo detalhamento dos fatos. Não é por
outro motivo que os programas jornalísticos matutinos abrem seus noticiários
com a leitura das manchetes dos jornais.
Noutros tempos - e de certa forma continua em alguns
aspectos -, o fechamento de uma edição se constituía num verdadeiro martírio.
Além da vigilância dos interesses políticos e da censura por muito tempo, as
últimas checagens dos acontecidos sempre atrasavam o trabalho das impressoras.
E tantas e tantas vezes o velho jornalista, já noite alta correndo, com cigarro
no canto da boca e uma xícara de café ao alcance da mão, ainda dedilhava na
máquina de escrever aquilo que não poderia ficar sem o conhecimento da
população. Tudo artesanal, tudo num penoso ofício para produzir informação.
Aquelas máquinas pararam. As matrizes xilográficas eram
muito trabalhosas de serem produzidas e com mão de obra escassa, pois exigindo
qualificação e verdadeiro amor na junção das letras contidas nos tipos. Dava um
trabalho danado juntar as linhas da escrita e depois colocar placas de metal
para garantir os espaços. Mesmo a introdução de novas rotativas e a composição
em linotipos, que davam agilidade ao processo, tiveram que dar lugar à
impressão offset e outras inovações tecnológicas tão necessárias a um veículo
rápido como o jornal impresso.
Este foi o percurso dos primitivos jornais sergipanos e
ainda à base da composição manual muitos funcionaram até recentemente, cedendo
lugar à composição mecânica e depois às impressoras de última geração. E o
jornalismo de cunho mais político que informativo, aos poucos foi cedendo
espaço a uma nova linguagem jornalística. Esta, indubitavelmente mais
abrangente e buscando se aproximar ao máximo da linguagem proporcionada por
outros meios de comunicação, como o rádio, a televisão e o jornalismo online.
Mas chegar ao estágio atual, ao denominado jornalismo
profissional em todos os sentidos, incluindo-se aspectos de apresentação
gráfica, impressão e distribuição, demandou uma aprendizagem que vem desde os
primeiros periódicos e diários sergipanos. Tudo num aprimoramento que remonta O
Recopilador Sergipano, editado em Estância pelo Monsenhor Antônio Fernandes da
Silveira a partir de 1832, e que foi o primeiro jornal a circular na então
província.
A partir de então muitos outros jornais surgiram, entre
diários, periódicos e semanários, e também como órgãos oficiais, dentre os
quais o Noticiador Sergipano, Correio Sergipense, A Razão, Jornal de Sergipe,
Jornal de Aracaju, Diário de Aracaju, Jornal da Cidade, Gazeta de Sergipe,
Folha da Praia, O Que, Tribuna Cultural, Cinform, Correio de Sergipe e Jornal
do Dia, dentre outros. Logicamente que alguns destes jornais, principalmente os
mais antigos, eram verdadeiros porta-vozes de partidos, governos ou ideologias
políticas, dando sustentação ou combatendo o poder dominante.
Muito mais noutros tempos que nos atuais, as páginas dos
jornais já serviram como verdadeiras tribunas para defesas apaixonadas e explanações
hoje consideradas como obras-primas do jornalismo, mas também para enfurecer
governantes, militares e a censura em geral. Por isso mesmo que não foram
poucos os jornalistas sergipanos que foram perseguidos e presos e sedes de
jornais invadidos e lacrados em nome da segurança nacional ou do poder
estadual. Era a questão de rezar ou não na cartilha do poder.
Impossível citar todos os nomes que glorificaram e ainda
continuam valorizando o jornalismo sergipano. Como dito, nomes existiram que
foram além do jornalismo para tornarem em temível tribuna os seus espaços,
principalmente através de editoriais e opiniões. Disseram nas páginas dos
jornais aquilo que tão bem ecoaria nas câmaras legislativas e, de certa forma,
foram ouvidos com retumbância. Daí o temor de tantos pelo que possam encontrar
nas páginas de um jornal. Daí também sua fundamental importância como meio de
informação.
E que celeiro imenso de jornalistas é Sergipe. Nomes como
Orlando Dantas, Manuel Cabral Machado, Mário Cabral, Clodomir Silva, Antônio
Garcia Filho, João Oliva, Ariosvaldo Figueiredo, Paulo Costa, Luís Antônio
Barreto, José Rosa, Luiz Eduardo Costa, Ancelmo Góes, Ivan Valença, Bemvindo
Sales de Campos e tantos outros de uma geração mais recente, demonstram bem que
a imprensa escrita sempre foi prodigiosa e inteligente.
E foi para engrandecer ainda mais o cenário do jornalismo
sergipano que há exatos dez anos surgia um jornal com uma proposta inovadora:
JORNAL DO DIA. Nascido em 2005 através de um grupo de jornalistas sergipanos,
já vingou com apresentação gráfica, visual e jornalística, totalmente diferente
daqueles moldes utilizados pelos principais diários locais. Um jornal menor, no
formato tabloide, mais leve, mais acessível, porém com primoroso conteúdo
informativo.
Ao longo dos anos, o JORNAL DO DIA foi aprimorando sua
apresentação gráfica e enriquecendo ainda mais a sua função informativa e
analítica, contando ainda com a participação de diversos colaboradores locais e
nacionais. Tornou-se, sem dúvida, na primeira leitura quando o assunto é
política sergipana. Por isso mesmo que os sites noticiosos, os programas
radiofônicos e os bastidores da política sempre repetem que o fato tido como
novo já havia sido informado na página 5 do JORNAL DO DIA.
São, pois, dez anos de informação e coerência com a verdade.
Uma bela manchete nas páginas da imprensa sergipana. Uma honra que noutros
tempos o menino jornaleiro anunciaria como O dia do JORNAL DO DIA.
* Rangel Alves da Costa é advogado e escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Texto e imagem
reproduzidos do site: jornaldodiase.com.br
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