Foto: César Oliveira.
Publicado originalmente no site Osmário Santos, em
17/05/2010.
Com boas histórias: Bemvindo Sales, um jornalista da pesada.
Por Osmário Santos.
Bemvindo Sales de Campos Neto nasceu em 23 de setembro de
1928, na cidade do Rio de Janeiro, sendo filho de João Sales de Campos e Odete
Ferreira Sales.
O pai foi durante muitos anos administrador da mesa redonda
da cidade de Estância, fiscal de renda do Estado e fundador do Ipes.
Um homem extraordinário na concepção de Bemvindo, que era
compositor, boêmio, poeta, cantor e muito liberal. Um homem, que pela sua veia
revolucionária na revolução comandada por Maynard Gomes, foi preso, fugindo
posteriormente para o Rio de Janeiro, onde conheceu a sua Odete, vindo da união
o carioca, apenas de nascimento, Bemvindo de Sales Campos Neto.
Hoje em vida, o filho aplica a honestidade tão bem passada
por memoráveis lições. “Meu filho,
por amor de Deus, não tire um tostão do palácio pra você”.
Por ter sua mãe morta quando tinha um ano de idade, Bemvindo
não possui nenhuma lembrança dela.
Um ano após a morte da mãe, veio morar em Aracaju com seus
avós, chegando no ano de 1929. Uma infância cheia de peripécias, deliciando-se
da brisa do Ivo do Prado, quando morava na fundição, onde hoje é a Capitania
dos Portos. Ali tinha duas casinhas iguais e, adiante, tinha uma fundição, onde
produzia trabalhos em ferro e bronze para embarcações. Da Capitania dos Portos
até o Cotinguiba, naquela época, chamava-se Fundição. De lá até a praia 13 de
Julho, chamava-se O Carvão e Praia Formosa.
Na idade de ir para a escola, em vista do casamento do pai,
já retornando a Sergipe, sem mais impedimentos políticos, foi morar com ele, na
cidade de Estância.
Não se lembra da primeira professora, mas tem grandes
recordações da famosa professora Maroca Monteiro, do Colégio Camerino, que
recebia em Estância alunos vindos de todo o Estado, por sua capacidade de
educadora, dizendo que foi ela responsável por um bem feito curso primário,
reforçando no 4º ano, com os ensinamentos da professora Ofenísia Soares Freire,
prima de sua madrasta.
Em Aracaju, veio fazer o curso ginasial, estudando três anos
no Colégio Tobias Barreto e um ano no Colégio Atheneu Sergipense.
Foi sargento
No Tobias, dirigido pelo professor Zezinho Cardoso, que
funcionava em esquema militarizado, foi sargento e rebaixado a cabo quando foi
flagrado com a mão na botija. “Uma vez o professor Zezinho me pegou roubando
uma manga rosa e daí fiquei como cabo”.
Concluiu o curso ginasial no ano de 1944, indo morar em
Propriá junto ao pai, que tinha sido transferido para aquela cidade por motivo
de trabalho.
Resolveu deixar os estudos para enfrentar o trabalho, com
primeiro emprego na Exatoria, como
ajudante de despachantes. Depois, foi encarando o trabalho
numa boa, sempre com o gosto de experimentar algo de novo. Foi representante
comercial, vendendo material químico, indo parar no ramo de sal da Usina
Mangaba, de Nestor Dantas, irmão de Orlando Dantas. Vendia em Sergipe, Alagoas
e Bahia. O sal era transportado por navio e trem.
Vendedor esperto, ainda construiu um depósito em Propriá,
dando-se bem até que o Rio Grande do Norte entrou no mercado de sal, acabando
com o sal de Sergipe e deixando Bemvindo a ver navios.
Em Propriá, ainda no tempo das vacas gordas, de muito sal,
escrevia coisas bonitas para as meninas, até que num certo dia resolveu
publicar uma de suas crônicas de amor, que resultou os primeiro trabalho na
imprensa de Sergipe, através do Correio de Propriá, um dos jornais mais antigos
do interior de Sergipe, que foi fundado por Domúsio de Aquino, famoso político
sergipano de Propriá, que foi deputado, sendo um dos republicanos fervorosos. O
jornal ainda existe, sendo dirigido por Jaime Laudário, que está velhinho, mas
continua firme no jornalismo, lutando e mantendo o jornal. “É um herói”. Saindo
do sal foi ser vendedor de Eliezer Góes onde viajou por todo o são Francisco,
vendendo perfume e calçados.
Foi escrivão de polícia
Vindo até Aracaju para participar de Congresso Eucarístico,
ficou na casa da tia, quando passou a sentir saudades do tempo em que pintava e
bordava na cidade. Não resistindo, após o evento religioso, resolveu trabalhar
no comércio de Aracaju, conseguindo emprego na maior barbada com a firma Preço
Fixo, que funcionava onde hoje é a esquina Ric, na rua Itabaianinha, na função
de balconista.
Depois, foi trabalhar na firma J. Carneiro, na rua São
Cristóvão, vendendo produtos farmacêuticos. Sempre na procura do melhor, foi
ser representante de Hercílio Prado Almeida, chegando tempos depois, na Polícia
civil, como ajudante de escrivão, graças ao amigo de Própria, Paulo Xavier de
Andrade Moura, que era o chefe de Polícia da época. Dois anos depois chegou em
casa com um revólver bonito no quarto. “Meu pai perguntou o que era. Quando
disse que era uma arma, ele mandou que eu, imediatamente voltasse para
devolve-la e para pedir demissão, pois não queria me ver como pistoleiro, nem
como investigador”.
Dos inquéritos em que participou como ajudante de escrivão,
não pode deixar de falar aos relacionados com defloramento, por despertar-lhe
uma atenção especial. Eu assistia aos exames médicos de defloramento, quando
acontecia os exames das meninas que vinham do interior, desvirginadas pelos
malandros. O médico fazendo exame, eu aqui olhando e datilografando o que ele
ditava (risos). Saindo da Polícia civil, com ajuda do pai, que era amigo do Dr.
Marcos Freire de Jesus, um dos grandes administradores de Aracaju, tendo sido
presidente da Assembleia Legislativa, governador interino, deputado federal e
prefeito de Aracaju, Bemvindo foi nomeado encarregado do expediente da Câmara
Municipal de Aracaju, onde fez carreira, saindo como diretor.
Sendo ligado à família Alencar por laços de afetividade,
recebeu de Alencar Filho o convite para ser o seu assistente no gabinete do
então prefeito Godofredo Diniz Gonçalves. Com o golpe de 64, Alencar saindo do
cargo, Bemvindo assume o cargo de gabinete do prefeito, o equivalente hoje a
secretário geral da prefeitura. Tempos depois, foi nomeado por Godofredo como
secretário de Administração Geral.
Com a posse de Lourival Baptista no governo de Sergipe, não
recusou o convite do governador e foi nomeado secretário de imprensa,
administrador do Palácio Olímpio Campos, controlador de verbas e assistente
técnico do governo. Uma façanha e tanta. Bemvindo, mostrando os dentes e o seu
largo sorriso diz: “Exerci quatro cargos e só ganhava por um, por proibição da
lei”. Após saída de Lourival do governo, voltou para a Câmara de Vereadores,
mas logo foi requisitado pelo Tribunal de Contas. Assim aconteceu por ter feito
concurso para escrivão e conquistado o 1º lugar.
Sendo sempre requisitado, foi nomeado secretário de Imprensa
de governo José Rollemberg Leite, continuando como assessor de Imprensa do
governo Augusto Franco, quando foi aposentado como escrivão efetivo do Tribunal
de Contas.
Com João Alves assumindo o governo do Estado, foi nomeado
assessor de Imprensa, continuando na função no governo de Antônio Carlos
Valadares. No Tribunal de Justiça, também trabalhou como assessor de Imprensa,
voltando no segundo governo de João Alves, com a Assessoria de Imprensa, com
toda sua experiência de jornalismo no serviço público.
Jornalismo
No Jornalismo, uma outra história, que inicia em Aracaju, no
tempo em que trabalhava na Polícia Civil, quando fez amizade com um dos
políticos responsáveis por um dos jornais de circulação da época.
Havia aqui três jornais: o do PSD, que era do governo,
chamado Diário de Sergipe, o jornal de Paulo Costa, Sergipe Jornal, que era o
balanço nem de um lado, nem de outro, pois era imparcial, e existia o jornal da
UDN, que era o Correio de Aracaju. “Fui escrever uma coluna no Diário de
Sergipe, do PSD, que dei o nome de Chumbo Muído atendendo convite do Dr. Marcos
Ferreira de Jesus”.
Atuou no jornal O Nordeste, pertencente a Francisco de
Araújo Macêdo, que era presidente do Partido Trabalhista Brasileiro, Sempre com
os bolsos limpos, foi escrever a Gazeta Socialista de Orlando Dantas, que tinha
sua redação na rua são Vicente. Era o responsável da coluna literária.
Bemvindo conta que na Gazeta Socialista, só escrevia o que
era ligado ao partido. Seu Orlando, Antônio Garcia, José Rosa, Hildegardes,
Astrogélio Porto, Bandinha, fazendo esporte e outros intelectuais da época.
Convidado por Hugo Costa escreveu no Sergipe Jornal. Sempre
cotado, passou pelo jornal da UDN, Correio de Aracaju. Os diretores eram: Fernando
Franco e Gilton Garcia. No Correio de Aracaju Bemvindo trabalhou como diretor
gerente. O jornal combatia Seixas Dória.
Passagem pelo rádio
Bemvindo também registrou passagem no rádio sergipano,
trabalhando como produtor de programas na Rádio Cultura. “Trabalhei uns três
anos, tendo produzido vários programas: Radioscope, Arraial da Panelinha,
Encantamento e outros que não me lembro mais.
Como secretário de Imprensa foi diretor da Rádio Difusora
por algumas vezes, por ocasião das viagens do diretor Santos Santana. Na
Revista Alvorada, trabalhou por cinco anos, como diretor cultural. No polimento
da memória pela sua passagem em jornais de Aracaju, lembrou-se a tempo de dizer
que no seu tempo de estudante, fez o jornal O Imparcial. Já adulto, tentou
reeditá-lo e não deu certo. No Tribunal de Justiça, editou três revistas, e era
o responsável pelo Diário Oficial do Tribunal. “Hoje não tem, mas na minha
época tinha. Saía na primeira página a foto do presidente, dos desembargadores,
recebendo autoridades, numa solenidade.
Editou o Álbum de Sergipe nos anos de 89 e 90. Pouca gente
em Sergipe conhece. Participou da Revista de Aracaju, que foi editada por ele,
Hugo Costa e Santos Santana. Escreveu crônicas na Gazeta de Sergipe, Jornal da
Manhã, escrevendo atualmente na Folha da Praia, com muita leveza.
Considera memorável o período em que foi eleito presidente
da Associação Sergipana de Imprensa, quando passou a conviver mais com colegas
de profissão. Gostou tanto que promete, na saída de Elito Vasconcelos, sair
candidato, com força e disposição total.
De feito como jornalista que considera um marco, foi quando
fez uma entrevista com o senador Leandro Maciel. Aconteceui em plena revolução,
quando todo mundo tinha medo das Forças Armadas, Exército, principalmente.
“Perguntei a ele se podia fazer umas perguntas para revista Alvorada. Ele me
respondeu: Perfeitamente. Quando perguntei se me respondia tudo que
perguntasse, também me respondeu com o seu perfeitamente Aí fiz a entrevista,
onde ninguém naquela época respondia nada, pois todo mundo tinha medo. Preparei
as perguntas mostrei ao diretor da revista, Hildebrando, o Bandinha, levei e
Leandro me respondeu todas. Tinha uma que era a seguinte: O Senhor acha que a
revolução já cumpriu o seu papel e que os militares devem voltar aos quartéis?
Ele me respondeu: Perfeitamente, é uma boa pergunta, é isso mesmo que eu penso,
pois já é tempo dos civis voltarem a tomar conta do Brasil. Isso foi um sucesso
na época”.
Cabarés
Na vida noturna de Aracaju, Bemvindo sempre foi bem vindo
pelas mulheres, quando era um dos bons dançarinos de tango, dos cabarés de
Aracaju. Das mulheres da noite que fizeram sucesso, ele se lembra muito bem:
Maria Pernambucana, uma mulher lindíssima, que os homens pagavam rios de
dinheiro e ela só iria com quem bem queria. China, uma outra mulher bonita.
“Nessa época eu era bonitão e dinheiro era para os bestas, os velhinhos. Comigo
a conversa era outra, pois eu ia com muito carinho”.
Uma outra lembrança, vem de uma chácara no bairro Santo
Antônio freqüentada pelos homens da alta sociedade sergipana. A chácara era de
Agrepino Leite, que construiu uma casa belíssima. Quando ele morreu, os filhos
venderam e o seu proprietário alugou a Nelson de Rubina, que fez um senhor
cabaré chamado Rancho Alegre. Era um cassino onde só tinha mulheres da Bahia e
do Rio de Janeiro.
Família
Casou com Maria Aliamor ribeiro, com mais de 25 anos de
união, tendo dois filhos: João Mário e Odete. É avô de dois netos.
Texto reproduzido do site:
usuarioweb.infonet.com.br/~osmario
Esse comentário sobre Benvindo é verdadeiro é legítimo, é terno ,amigo , mas falta muito, mas muito mesmo para descrever a riqueza cultural, o conhecimento dos sergipanos, dos políticos, do povo em geral, da beleza interior, do grande coração que Benvindo tinha, do amor imenso da ternura pela sua esposa e filhos das histórias que contava é encantavam até as crianças .Esse é meu Benvindo do qual temos saudades e jamais esquecerei.Foi-se o carioca, mais sergipano que eu conheci.Obrigada, Armando, por lembrar -se desse grande jornalista, cronista e amigo dos amigos que foi meu irmão
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