Publicado originalmente no Facebook/Amaral Cavalcante, em 17/02/2017.
A imprensa do arco da velha.
O primeiro jornal que eu conheci foi o Jornal “A Semana”, de
Simão Dias. Escrito, editado, ilustrado e impresso pelo jornalista Zeca Déda,
era produzido no antigo processo tipográfico: cada linha era pacientemente
composta com seus respectivos espaços e pontuações, a partir de letras de
chumbo separadas por fontes e tamanhos em centenas de escaninhos dispostos em
gavetas.
Já em Aracaju, o primeiro jornal onde eu trabalhei foi o
“Sergipe Jornal” que fora do Jornalista Paulo Costa e houvera sido comprado por
José Carlos Teixeira. Era editado, então, por Edmundo de Paula e composto,
ainda, por tipos móveis e impresso numa velha máquina apelidada de “perereca”,
zuadenta e estrambólica. O Sergipe Jornal, vendido ao grupo “Diários
Associados”, de Assis Chateaubriand, deu lugar ao “Diário de Aracaju”, editado
por Raymundo Luiz da Silva e já em processo de linotipia. A máquina Linotipo,
inóspita e barulhenta, era como um dragão de sete cabeças vomitando os lingotes
de chumbo que, devidamente empilhados, formatavam a página matriz para a
impressão do jornal.
A Linotipo
Agora imaginem vocês a Linotipo, um monstrengo de ferro
alimentado com chumbo derretido a não sei quantos graus, chiando e bufando
fedores num ambiente exíguo e sem ventilação, enquanto movia hastes e alavancas
como um transformer louco, para, depois de tanta zuada, cuspir apenas um
lingote de letras formando uma frase, na bandeja final. Uma tirinha de chumbo
onde se lia: “ na tarde dessa quinta feira o meliante”... O calor era tanto e
tão grande o stress nas oficinas que os linotipistas só trabalhavam tungados na
cachaça. Os vapores do chumbo abreviaram a vida de muitos deles.
Depois, esses lingotes eram acomodados em uma bandeja de
ferro com travas delimitando o espaço da página e, ali, formavam a uma coluna
de chumbo com a matéria. Os títulos ainda eram compostos com letras
tipográficas e as lustrações, em forma de clichê, gravadas com ácido numa placa
de zinco e pregadas depois num suporte de madeira para alcançar a altura dos
lingotes. Cada jornal tinha a sua clicheria com fotos das principais
autoridades já devidamente montadas, para uso eventual. Era caro produzi-los e
não era todo dia que a clicheria dispunha de material para tanto. Assim, eram
constantemente usados os mesmos clichês para ilustrar matérias diversas.
Não era raro trocarem-se os clichês, muitos deles meio
apagados pelo uso constante. Na Gazeta de Sergipe, certa vez, publicaram o
clichê do piedoso arcebispo D. Brandão ilustrando a notícia sobre a fuga de um
“perigoso meliante”. O clicherista miope foi demitido.
Pronta a página com os lingotes de chumbo devidamente
arrochados e os clichês colocados na altura certa, a tarefa era levar até a
Perereca impressora o pesado trambolho, sem o desmanchar. De lá saia o jornal
nosso de cada dia.
A modernidade gráfica foi implantada entre nós por Nazário
Pimentel e Ivan Valença, no avançado “Jornal da Cidade”, composto em máquina
IBM de esfera e impresso em Off-Set.
Amaral Cavalcante - 2004.
Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Amaral Cavalcante.
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