Post compartilhado do Perfil do Facebook/Paulo Roberto Dantas Brandão, de 14 de julho de 2023
Uma carta sobre o novo livro de Jorge Carvalho
Caro Jorge
Ontem, após o lançamento do seu livro, e aproveitando uma noite com insônia, li quase todo. Uma delícia, parabéns.
O livro ajudou-me a esconjurar preconceitos. Um desses era com as colunas sociais. Acreditei sempre naquela hierarquia que você tão bem cita existir nas redações. Hierarquia de importância, diga-se bem. Em primeiro plano vinham os jornalistas de política, e logo depois os de economia. Formavam a casta superior das redações. Depois vinham os que trabalhavam nas editorias gerais. Lá no fim, vinham os colunistas sociais, os de esporte e finalmente os da editoria de polícia. Puro preconceito. Por exemplo, um dos melhores textos que existiram na imprensa brasileira foi de Armando Nogueira, que escrevia sobre esporte.
Eu confesso que torcia o nariz para as colunas sociais. Seu livro me fez lembrar, porém, que quando leitor assíduo do Jornal do Brasil a primeira coisa que buscava ler era a Coluna do Zózimo. Zózimo Barroso do Amaral era impagável. Uma vez foi preso. Preso político. Ao chegar a cela um dos detentos exclamou: “É o Zózimo. Pessoal, tá tudo doido. Estão prendendo eles mesmo”. Puro despeito, pois Zózimo jamais apoiou a ditadura. Hoje, leitor da Folha de S. Paulo na internet, uma das minhas primeiras leituras é a coluna da Mônica Bergamo.
Já no Globo ridicularizava quem gostava do Ibrahim Sued. Mas um cara que tinha como repórteres Elio Gaspari e Ricardo Boechat não podia ser ruim. Boechat destacou-se como colunista, substituindo o próprio Ibrahin, e depois na TV como apresentador e comentarista de primeira, e Gaspari não só como colunista, mas também como escritor/historiador com seus cinco volumes sobre a Ditadura Militar (que até hoje enriquecem minha estante, e são objeto de consultas constantes) que faz parte do primeiro time do jornalismo brasileiro. Hoje reconheço que deveria ter dado mais atenção a essas páginas.
Senti falta em seu excelente livro de um colunista que eu colocava também em destaque. É o Giba Um, pseudônimo de Gilberto de Pierro. Talvez por escrever de S Paulo sua repercussão entre nós fosse menor. Giba assinava uma coluna na Folha da Tarde (da Folha de S. Paulo), que era uma delícia. Chegavam poucos exemplares da FT em Aracaju, e o dono da banca de jornais fazia o favor de reservar um deles para mim.
Sobre os colunistas sergipanos que você enumera, ainda estou lendo. Ainda vou ruminar a respeito. Conheci ou conheço quase todos. Trabalhei com grande parte deles. Vou tentar comentar depois, até porque não quero ser injusto com nenhum.
Quero falar, porém, de um que você dedicou modestas cinco linhas, e identificou apenas como Paulo Roberto, que escreveu a coluna Pessoas e Fatos na Gazeta de Sergipe em meados dos anos 1960. Quem é o misterioso Paulo Roberto, meu xará? Orlando Dantas, o diretor e dono da Gazeta queria criar a coluna Pessoas e Fatos. Mas não queria assinar seu nome. Assim criou o pseudônimo de Paulo Roberto, em homenagem ao seu neto querido de meros sete para oito anos. Esse neto, hoje chegando à velhice, tem orgulho de ter dado o seu nome ao único pseudônimo que Orlando Dantas utilizou em sua vida. Mas não foi Orlando Dantas o único redator da coluna. Escreveu as primeiras, e depois passou para Ivan Valença e Luis Antônio Barreto, entre outros. Frequentemente Seu Orlando redigia algumas notinhas, mas não existia um colunista fixo.
A coluna de Paulo Roberto registrou dois fatos interessantes que lembro terem me contado. O primeiro foi com o Padre Luciano Duarte (ainda não tinha sido sagrado bispo). Uma notinha qualquer deixou o Padre furibundo. Foi à redação da Gazeta e queria porque queria falar com Paulo Roberto, e só sairia dali depois de ter uma conversa com o ousado jornalista. Tiveram que chamar Orlando Dantas para falar com o Padre. Os dois não se bicavam, mas resolveram a pendenga deixando Paulo Roberto em paz.
O outro foi mais grave. Uma outra notinha indignou o Comandante do 28º BC, que intimou Paulo Roberto a comparecer ao quartel. Mais uma vez Orlando Dantas foi em seu lugar. O Coronel não queria falar com ele, queria tomar providências contra Paulo Roberto. Após muita conversa, Orlando Dantas convenceu o militar que a coluna era coletiva. Que o único Paulo Roberto que existia era seu neto de oito anos. Se quisesse, ele traria ao quartel para o Comandante ver. No final, o prestígio de Orlando Dantas falou mais alto, e ficou o dito pelo e não dito. E Paulo Roberto poderia ser, quem sabe, o preso político mais jovem que se tem notícia. Ainda bem que não foi.
Um abraço, Paulo Roberto Dantas Brandão
Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Paulo Roberto Dantas Brandão