Legenda da foto: Bancas de revista, marcas de uma resistência cultural da mídia impressa
Artigo compartilhado do site JLPOLÍTICA, de 23 de outubro de 2023
Aracaju no tempo das Bancas de Revista e a proposta do jornalista Cláudio Nunes
Por Antonio Passos*
As bancas de revista já foram cantadas na música popular brasileira. Em “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, lançada em 1967 e considerada o marco inicial do Tropicalismo, elas estão lá: “O sol nas bancas de revista / Me enche de alegria e preguiça”.
No ano seguinte, 1968, o antológico LP “Tropicália ou Panis et Circences” trouxe “Geleia Geral”, uma composição de Gilberto Gil e Torquato Neto, fazendo referência a um dos principais produtos das bancas de revista: “Na geleia geral brasileira / Que o Jornal do Brasil anuncia”.
As bancas de revista estavam nas canções porque eram pontos de destaque na paisagem urbana da época. Eram janelas pelas quais as cidades olhavam para si mesmas, para o Brasil e para o mundo, não só por meio das notícias, mas do acesso à circulação de ideias, debates e burburinhos em geral.
Aracaju foi uma cidade com muitas bancas de revista. Não por acaso, aqui elas também foram cantadas. Em “Coisas de Aracaju”, de Beto Cego, lançada em 1989 no LP “Aracaju Pra Cantar”, podemos ouvir: “Nas bancas de revista / Manchetes e jornais / Coqueirais, manguezais / Belezas naturais / Coisas de Aracaju”.
Não sei quando elas chegaram em Sergipe. O meu contato com as bancas de revista aconteceu quando comecei a andar pelas “ruas de Ara”, no decorrer dos anos 1970.
A maior aglomeração estava entre o Centro e o bairro São José. Haviam também algumas mais afastadas, a exemplo das bancas da Praça da Bandeira, da Praça Dom José Thomas no Siqueira Campos, e a banca de revista da Atalaia.
Conversando com um amigo da mesma idade que eu, descobrimos que embora só tenhamos nos aproximado há pouco tempo, tivemos a experiência comum, na adolescência, de ser carrapatos de banca de revista.
Lá ficavam expostas capas de jornais, livros, revistas e publicações impressas de modo geral. As bancas eram antes de tudo um espetáculo visual. Com discrição e sem abuso, era possível arriscar uma foleada aqui e outra ali, como quem procura algo e não encontra.
Tive um amor à primeira vista com o Jornal do Brasil, diário carioca que nos anos 1980 perdeu a preferência dos mais descolados da aldeia para a Folha de S. Paulo.
Fazer alguma viagem para outras capitais era a oportunidade de visitar bancas monumentais. Lembro de impressionantes bancas de revista em Recife, São Paulo e Salvador - a primeira cidade na qual vi pessoas lendo jornais dentro dos ônibus.
Já em 2007, ano que morei no Rio de Janeiro, cumpri uma despedida honrosa: vivenciei a última temporada de compra diária do meu impresso preferido e tive uma crônica publicada na Revista Domingo do JB, no dia 22 de julho: “Duas Barroquinhas”.
Para mim foi como colocar a cereja em um bolo que comecei a fazer muitos anos antes, aqui mesmo em Aracaju, no namoro com as bancas de revista.
Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, Diário de Notícias, Gazeta de Sergipe, Jornal da Cidade, Folha da Praia, Cinform, Jornal do Dia. As revistas Leia, Bizz, Imprensa, Interview, República, Trip, Bundas, estão entre as que mais chamaram a minha atenção.
No centro da cidade de Aracaju haviam bancas famosas: a da Praça General Valadão, a de Roberto, em frente a Ponte do Imperador. A do Careca, na praça da Catedral. No São José, a charmosa banca do Mini Golfe e outras nas praças do Atheneu, Tobias Barreto e Camerino. Aquele era um tempo no qual jornalismo e imprensa eram sinônimos.
Esses dias, o amigo Marcone Borges, com quem tive a conversa sobre bancas de revista, me enviou uma matéria assinada pelo jornalista Cláudio Nunes, propondo que a Banca do Careca seja transformada em patrimônio cultural de Aracaju. Uma boa sugestão.
Para quem não vivenciou o auge das bancas de revista e quiser experimentar a ambiência, salvo engano, a da Praça General Valadão e mais algumas entre o Centro e o São José sobrevivem. Existem também livrarias que conservam algo das antigas bancas: uma delas em um supermercado, na Av. Francisco Porto.
Mesmo que tenham perdido a centralidade na comunicação, os impressos continuam no mercado, porque parecem oferecer um tipo de interação entre leitor e texto que escapa ao vuco-vuco das redes sociais.
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* O articulista é jornalista e professor.
Texto e imagem reproduzidos do site: www jlpolitica com br
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