Nirlando Beirão é redator-chefe da “CartaCapital” e escreveu nas
principais publicações brasileiras | Foto: Reprodução
REGISTRO de publicação feita em 02/06/2019
Publicado originalmente no site JORNAL OPÇÃO, em 02 de junho de 2019
Nirlando Beirão lança livro e conta que tem a doença ELA
Por Euler de França Belém
O redator-chefe da “CartaCapital” usa cadeira de rodas, mas
continua escrevendo na revista e está lançando um livro
Tenho uma certeza: vou morrer (“Eu sei que vou morrer / Não
sei o dia / Levarei saudades da Maria /Sei que vou morrer /Não sei a hora”,
ensina a música de Ataulfo Alves). De quê, não sei. Mas é possível que tenha a
ver com trombofilia — um problema genético que me levou a ter uma tromboembolia
(e quase à cova ou ao crematório) e, em seguida, três hemorragias (uma delas, a
mais leve, provocada por uma simples vacina antitetânica), decorrentes, em
parte, do uso de anticoagulantes (o que me leva quase a uma hemofilia induzida;
com o tempo, meu organismo acabou absorvendo ferro em quantidades que
surpreendem gastroenterologistas e hematologistas, e estou às portas de uma
cirrose, e sem beber uma gota de álcool). A morte, todos sabem, é infalível.
Mas ninguém — nem eu — quer morrer. Mesmo quando sofremos, à beira do
precipício, queremos sobreviver, nos agarrando às últimas gramíneas. Por vários
motivos. Um deles? A vida é boa e bela.
Nirlando Beirão lança um livro desses que, embora não muito
robusto — ao contrário dos livros sobre a Segunda Guerra Mundial (teria de
viver como Matusalém para ler 25% deles) —, devem ser considerados imperdíveis,
e não só para nós, os que temos problemas crônicos e somos pacientes frequentes
dos consultórios e laboratórios (sou conhecido pelo nome, até porque tenho de
escolher quem me tira sangue, dada a dificuldade), e sim para todos que estão
vivíssimos e saudáveis, mas um dia, doentes ou não, vão bater as cachuletas.
O jornalista Nirlando Beirão, redator-chefe da revista
“CartaCapital”, escreveu “Meus Começos e Meu Fim” (Companhia das Letras, 192
páginas), no qual revela que tem ELA (a mesma doença que levou o jornalista
Rodolfo Fernandes, diretor de redação de “O Globo”, e o historiador Tony Judt)
e conta sua história (e não apenas a da doença). Ele continua escrevendo, como
indica o livro e seus textos excelentes para a “CartaCapital” (como um recente
sobre Gianni Carta, filho de Mino Carta, que morreu de câncer com meros 55
anos, no auge da profissão). Há uma luta diária do esforço — da força de
vontade — contra a acomodação e, claro, o poder corrosivo e em desenvolvimento
da doença.
Sinopse da Editora Companhia das Letras: “Em julho de 2016,
Nirlando Beirão foi diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). O
ímpeto de registrar em prosa a rápida evolução da doença avivou no jornalista o
antigo projeto de escrever a história do amor secreto de seus avós paternos.
“Nascido em Portugal, António Beirão formou-se padre no
seminário de Viseu, onde teve como colega um xará de sobrenome Salazar. Beirão
se mudou para o Brasil no início do século passado, e tornou-se pároco numa
pacata cidade no interior de Minas Gerais. Encantado pela jovem Esméria de
Miranda, o vigário trocou o amor divino pela paixão terrena. O casal fugiu de
Oliveira, deixando para trás sua história, um segredo que pairaria como uma
sombra sobre as futuras gerações.
“Em ‘Meus Começos e Meu Fim, o passado familiar se mescla
aos duros desafios das vivências do momento. Como se falar de um amor proibido
e corajoso pudesse impedir qualquer acesso de autocomiseração.”
O médico Drauzio Varella escreveu: “Os textos de Nirlando
Beirão sempre estiveram entre os melhores do jornalismo brasileiro. Neste
livro, ele reúne histórias do passado para confrontá-las com as adversidades
enfrentadas por alguém com uma doença que impõe debilidade muscular
progressiva, com graves limitações físicas. O resultado é uma reflexão profunda
sobre o significado e a fragilidade da existência humana”.
[O único problema de Nirlando Beirão é que parece acreditar
que Deus só “construiu” o mundo em seis dias porque ao seu lado estava Mino
Carta. Este, no sétimo dia, escreveu a história da feitura, se tornou um dos
autores da Bíblia e, quem sabe, irmão de Jesus Cristo. Brincadeira à parte,
tanto Nirlando Beirão quanto Mino Carta são jornalistas extraordinários. Pode
se discordar de suas ideologias — são próximos da esquerda petista (mais Mino
Carta, porque Nirlando Beirão, embora um insider, guarda certa distância, quiçá
produto de sua veia irônica) —, mas dificilmente se pode dizer que não são bons
jornalistas.]
Texto e imagens reproduzidos do site: jornalopcao.com.br
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