quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

'Uma ótima biografia de Cleomar', por Marcos Cardoso


Publicado originalmente no site do Portal INFONET, em 12 de fevereiro de 2021

Uma ótima biografia de Cleomar
Por Marcos Cardoso (do blog Infonet) *

Publicar uma biografia não é uma tarefa simples, até para quem sabe pesquisar e escrever. Mesmo que o autor não consiga fazer do personagem biografado um objeto de história total, “histórica e humanamente exemplar em relação ao passado e presente”, como informa Jacques Le Goff no seu monumental “São Francisco de Assis”, biografia do personagem impressionante da Idade Média. Se conseguir fugir à tentação da biografia anedótica e superficial terá realizado uma obra digna de ser lida e anotada.

O jornalista, poeta e escritor Gilson Souza mandou muito bem na biografia “Cleomar Brandi – Uma vida inteira”, sobre o jornalista, poeta e amigo baiano que, com seu jeito muito humano e um tanto heroico, cativou uma geração inteira de sergipanos ligados à imprensa e à política, à literatura e à música, à educação e à cultura em geral.

“Não estamos tratando aqui de um político influente, ou uma celebridade das artes, do esporte, do mundo acadêmico e muito menos do poder econômico. É a história de um simples cidadão paraplégico que se transformou num gigante diante das adversidades impostas pela vida”, anuncia o autor do livro, que foi iniciado logo que Cleomar morreu. Gilson partiu para Ipiaú, na Bahia, para pesquisar a ancestralidade e as raízes mais profundas do homenageado. No mês de julho faz 10 anos que Cleomar nos deixou.

Ele aprofundou-se na vida e na alma de Cleomar, conheceu os caminhos percorridos, da infância no interior cacaueiro à adolescência travessa na Cidade Alta e no Unhão, em Salvador, onde aos 16 anos foi acometido da estranha moléstia que o transformou no homem de cadeira de rodas, moldando a sua perspectiva de mundo. “O irmão mais velho, Luiz Fernando, estava em casa quando Cleomar surgiu corredor adentro tropeçando, reclamando das pernas e com muitas dores nas costas. ‘Mamãe ajeitou a cama e mandou ele se deitar. Ele deitou e nunca mais levantou’”.

Gilson Souza foi certamente o melhor de todos os amigos de Cleomar. Dele tornou-se irmão, “guardião” das suas memórias e curador de sua obra literária, como recorda a também jornalista Arlinda Carvalho, grande amor dentre todos os amores do biografado, que prefacia a obra.

“A sensibilidade de Gilson Souza nos envolve sem piedade numa narrativa com efeitos surpreendentes que vão do riso à comoção, da ironia ao escracho, da contagiante alegria de viver de Cleomar (que atravessa as páginas do livro e atinge em cheio a alma do leitor, sem nenhum desvio) ao inconformismo manso desencadeado pela despedida do poeta”, escreveu ela.

“Nestas páginas, o leitor será nocauteado tanto pela grandeza do ser humano quanto pela intelectualidade do jornalista, poeta e boêmio, cujos rasgos de genialidade eram arremessados nas redações dos jornais onde trabalhava, nas mesas de bar (sempre cercado por amigos e artistas) ou em qualquer esquina”, Arlinda antecipa.

O livro revive poemas e crônicas de Cleomar Brandi, dentre as quais a já bastante conhecida “A última saideira”. Também traz textos e depoimentos interessantíssimos de familiares, dos muitos amigos e de muitas namoradas. É uma obra bem completa, um livro bonito, bem editado e ilustrado, que tem a marca da Criação Editora e o patrocínio da Lei Aldir Blanc, via Fundação de Cultura e Arte Aperipê de Sergipe – Funcap/Governo do Estado.

A biografia está de acordo com o que Cleomar merece. Ê, vidão! Eu quero é mais!, diria ele.

* Marcos Cardoso é jornalista e escritor. Foi diretor de Redação do Jornal da Cidade, secretário de Comunicação da Prefeitura de Aracaju, diretor de Comunicação do Tribunal de Contas de Sergipe e é servidor de carreira da UFS. É autor dos livros “Sempre aos Domingos – Antologia de textos jornalísticos” e do romance “O Anofelino Solerte”.

Texto e imagem reproduzidos do site: blogger.com/blog

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